sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Você Merece o seu Animal?




Você Merece o Seu Animal?



-Você faz por merecer o seu bicho predileto que pensa que foi ele quem escolheu você? Você o leva para passear, deixa que ele perca suor, perca peso, tropece no tapete das etiquetas, babe por aquela cadelinha da lanchonete da esquina, ou se insinue para aquela outra zinha do apê vizinha, sempre engaiolada, cara de fuinha atrás de um amante de perdição escondendo o falso rabinho entre as pernas além do silicone no coração?

-Você lhe dá uma porção diária de ração natural de amor viçado, deixa-o pensar que manda e é o tal herói, quando ele faz um rápido cafuné maquinal decorado e depois dispensa tedioso você quintal afora, ou você, na próxima reaproximação, esconde o chinelo do dezelo íntimo dele; ou você saca bem a pequenez do tipo e rói o osso da mediocridade humana, sempre perdoando feito um anjo?. Ninguém merece, não é mesmo?

-E quando o seu animal fede como um gambá, sabe como é, o bicho não é lá muito de tomar banho, tem um sovaco vencido com cheiro de fedô que é um risco de vida pro seu ambiente natural de sensibilidade. Ele também deveria ter um poste pra se enxergar, não é isso, cara? Mas não caia nessa de retaliar. Tenha paciência. E quando o seu animal está no cio – e ele como auto-afirmação parece estar sempre no cio – pede a ração sedentária de sempre; rosna pro concorrente com cara de hipopótamo metrossexual, demarca território – cigarro, cinzas, caspas, cabelo caindo (a descompensação hormonal) – e ainda faz cara de enfezado, querendo concorrer com você em matéria de flatulência, demarcando território?. Onde já se viu isso? Proteja-se nessa hora. Evacuem o quarteirão!

-Cuidado com o seu animal. Ele fica cada vez pior com o passar dos anos. Deveria adotar um outro filho, um primo, talvez, um sobrinho pobre, um menor carente. Ajuda mútua. Ele dá bola pra você? Colocou um nome ridículo né não? Ele tem essas coisinhas impróprias lá dele, mas, no fundo o cachorrão está mesmo é querendo provar é o rei do pedaço, quando é um palhaço com juba. Pobre do seu animal. Decadência pura.

-E o canil de estimação dele, então, você acredita? Mal ventilado, tem tantos tarecos; ele tem um mau gosto incrível, você acaba tropeçando naquelas coisas todas, tarecos, restos dele, cacos dele, ácaros dele, pelagem dele, mas ele não sente como você, ele na verdade não tem o seu faro apurado, o instinto dele é mais de ataque irracional, você sabe, afinal, são os labirintos da cadeia alimentar, ele é meio lelé da cuca nessas coisas. Não cheira tudo o que come. Ele precisa é de um veterinário para dinossauro. Já pensou?

-Quando ele chamar você de pulguento querido, não ligue. Trate o seu animal como um bicho de estimação mas, perdoe. Esse é seu jeito todo gentil de ser fiel. Ele acha que vai durar muito, no entanto, se você não o levasse para passear, para correr, para dar voltas no parque, qual seria a desculpa que ele iria dar para morrer tenso, de enfarto, de estresse, de úlcera, de diabetes, de gula, de raiva, de nojo, pois que o lazarento adora carne vermelha e de se empanturrar de rações enlatadas, saturadas, embutidas, destilados, essas porcarias com grife. Ele está se matando e não sabe. E ele não entende os seus sinais. Enxerga e não vê. Pensa que pensa.

-Cuide bem de seu animal. Ele não está com essa corda toda não, mas tá se achando. Dê um tempo. Seja gentil mais uma vez. Pondere. Dê uma trégua. Afrouxe o laço. Faça-o pensar que está no comando. Sacou essa? Não arrebente o laço afetivo, essas relações com animais são assim mesmo, demoradas; é mesmo muito difícil criar vínculo, manter o elo, deixar pra lá as patifarias, o sal grosso das ocasiões, as nódoas de intenções, as gorduras ególatras do comportamento pseudo-racional, as triviais vaidades e os bocós objetos de adorno, bibelôs que nem Freud explica. Na verdade o seu animalzinho não cresceu ainda, não evolui direito a própria espécie desde que descobriu o fogo e a roda, é quase um brucutu ainda. Vai demorar um tempão.

-Cuide bem dele assim mesmo. Como o seu animal é exibido, não é assim? Vai a velório e quer aparecer mais do que o defunto. Carência é só isso. Trate-o bem. Não fique nervoso como ele que é sempre nervoso. Ele na verdade sabe que, quando há perigo, pode contar com você “de grátis”. Não late e não morde, não risca sofá com as unhas mas, às vezes é um perigo por isso mesmo, porque é muito barulhento, topetudo, turrão, medito a sebo. Quando não dissimula, camufla. Relaxe, muita calma nessa hora. Não adquirira a personalidade desse cavalo. Deite perto dele, permita um afago, se preciso, ouse, mie alto, imite um pangaré, dê umas lambidas de veludo nele, cheire, salte sobre migalhas de tremoços de saudades invisíveis, mas, segure a neura dele, a depressão, a crise, o esgotamento, sublimações enrustidas. Ele quer ser leão mas é um piolho. Às vezes um pólem. Ele não foi treinado para existir, é muito ruim de aprender, a sensibilidade dele está atrofiada faz séculos. Você é mil vezes melhor do que ele, mas, por favor, não deixe transparecer a sua superioridade. Seja humilde. A coleira é mais uma insegurança dele. Você é tudo o que ele tem. Quem mandou bancar animal de estimação de uma pessoinha problemática. Você foi escolhido por ser especial para a situação grave dele. Você pode ser a própria salvação dele.

-Quando ele abaixar a cabeça, derrotado, triste como uma lagartixa albina, saiba latir feito um muxoxo, ofereça a patinha num gesto de afeto, de compreensão, feito um ocasional salva-vidas. O seu ser humano de convivência é assim mesmo. Se você não fosse tão importante, essa pessoa não teria nada a não ser você. A troco da parca ração diária dele, ofereça companhia fiel. Isso é da sua natureza. Se o seu ser humano de estimação estiver meio abilolado e querer imitar você, deixe. Ele não tem competência para ser um cão, um gato, uma, girafa. Já andou de quatro e fez feio, até descobrir a condução móvel do cipó. Ame-o e deixe-o amar do jeito limitado dele, mal-e-mal um paquiderme, uma baleia azul. Você, cão, gato é superior a ele. Mas não demonstre. Seja forte sempre como você sempre foi. Segure as barras pesadas dele. As piores garras são a dos homens. Você sabe se ele foi vacinado? Esse reprodutor castrou tantos sonhos leais e nem sabe...

-As relações humanas doem, são complexas como você bem sacou, cheirando problemas. Então eles se amparam em seres como você, mas, verdade mesmo, os piores animais são eles, os homens, as mulheres. Os piores poluidores do Planeta Água. Brinque com ele mas fique com uma patinha atrás, de vez em quando. Anime-o, faça piruetas, leve-o para passear, seja serelepe, assim ele perde o colesterol, a barriga, melhora a circulação e, ainda, você será a bendita proteção dele, apesar dele pensar que é superior, essas coisas. Ele às vezes acha que é o que não é. Não tem limites, nem cercas, nem controle remoto. Faz parte. A vida é assim mesmo Lulu, Rex, Tintim, qualquer nome que você tenha, quer seja Donzela, Esfinge ou Sabonete, sabe, eles arrumam cada nome, não têm noção do ridículo mesmo. Isso é coisa da espécie humana às vezes nem tão humana assim. Você tem que sobreviver entre eles como puder, sem refugar, sempre perdoando.

-Você faz por merecer seu animal, mas, cá entre nós, o homem que pensa é seu Animal de Estimação (mas pensa que é seu dono), faz por merecer você? Cachorrinho, Gatinho, Papagaio, o que quer de precioso que você seja, tenha dó, cuide bem de seu animal de estimação, o egnimático Bicho Homem. Mil Luas pra você!
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Poeta Silas Corrêa Leite – E-mail: poesilas@terra.com.br - Site pessoal:
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