sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

PENSAMENTOS VARIADOS





Pensamentos


" Se não morre aquele que escreve um livro ou planta uma árvore, com mais razão, não morre o educador, que semeia vida e escreve na alma"Jean Piaget"Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende".(Guimarães Rosa)"Assim como uma única isca não pode atrair qualquer tipo de peixe, uma metodologia única não é capaz de alcançar diferentes tipos de alunos."( Monica Valéria ,minha amiga)" O vento é o mesmo mas sua resposta é diferente em cada folha"Cecília Meireles“Contaram-me e EsqueciVi e EntendiFiz e Aprendi”ConfúcioQuem pensa muito faz pouco. As pessoas entram em nossa vida por acaso, mas não é por acaso que elas permanecem.(Lilian Tonet)... Quem sabe faz a hora, não esperaacontecer...Não tenho um caminho novo. O que eu tenho de novo é um jeito de caminhar. (Thiago de Melo)O melhor educador é aquele que conseguiu educar a si mesmo(Sabedoria oriental)"Quem conduz e arrasta o mundo não são as máquinas, mas as idéias."Victor Hugo"Eduquem os meninos e não será necessário castigar os homens"(Pitágoras)“Um livro é como uma janela: quem não o lê fica distante dela e só pode ver uma pequena parte da paisagem."(Kahlil Gibran, escritor indiano)"Não se pode ensinar nada a um homem. Pode-se apenas ajudá-lo a encontrar a resposta dentro dele mesmo."(Galileu Galieli, cientista italiano)"A tarefa essencial do professor é despertar a alegria de trabalhar e de conhecer."(Albert Eisntein, cientista alemão, Como Vejo o Mundo)"Ninguém ignora tudo. Ninguém sabe tudo. Todos nós sabemos alguma coisa. Todos nós ignoramos alguma coisa. Por isso aprendemos sempre."(Paulo Freire, educador brasileiro)"Perigoso não é o homem que lê, é o que relê."(Voltaire, filósofo francês)"Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina."(Cora Coralina, poetisa brasileira)"Ser educador é ser um poeta do amor. Educar é acreditar na vida e ter esperança no futuro. Educar é semear com sabedoria e colher com paciência."Augusto Cury“Longo é o caminho do ensino por meio de teorias; breve e eficaz por meio de exemplos.” (Sêneca, filósofo romano - Epístolas )"Não concordo com uma única palavra do que dizes, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-las"(Voltaire)"Procure ser um homem de valor, em vez de procurar ser um homem de sucesso."(Albert Einstein)"Tratai os bons com bondade e os maus com justiça"(Confúcio)"Educar é construir, é libertar o ser humano das cadeias do determinismo ...".Paulo Freire"Carpe Diem" quer dizer "colha o dia". Colha o dia como se fosse um fruto maduro que amanhã estará podre. A vida não pode ser economizada para amanhã.(Rubem Alves)

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Museu da Língua Portuguesa: Pífio Padrão Global





Museu da Língua Portuguesa:

Pífio Padrão Global


Não acredito em arte


Que não seja libertação


Manuel Bandeira


-Como todo cidadão comum, tomei um ônibus na Vila Sônia, zona oeste de São Paulo, linha Estação da Luz, e lá fui, com a musa-vítima açodada pela propaganda, ver o tal Museu da Língua Portuguesa na Praça da Luz, centro velho roto e abandonado de São Paulo. Expectativa enorme, claro, muito mais para um poeta que estuda a língua-mátria, como diz o Caetano Veloso. Fui na onda midiática do momento. Fui interessado lá - comprovante número 5202 - ver o tal Museu da Língua Portuguesa, torcendo para vibrar com o sucesso aventado, crendo que iria adorar. Pobre e ledo engano. Infelizmente. -Desci no lado da Cásper Líbero (ponto final da linha do péssimo serviço de transporte coletivo urbano piorado demais) e, SURPRESA!. Desci e fiquei sem saber pra que lado era o tal lado do tal não apresentável estético Museu. Nenhuma placa, nenhum sinal, nenhum aviso, nada de nada. Incompetência estrutural, inclusive para incautos Turistas desavisados. Entrei na Estação perdidinho. Gente de monte, sujeira, correria, uma loucura - a pobre gente brasileira e a nefasta propaganda enganosa vendendo gato por lebrea - e nada de placa, sinal, aviso, gerenciamento. Quase atropelado fui em busca de uma só possível autoridade vigiadora ou informante local. Lá pelas tantas, um guardinha muito mal humorado, cara de azedo deu a dica com um humor risível irônico: -A filona é ali, sapecou ele, rindo do trouxa perguntador e curioso de uma figa. Sim, interessados em cultura, ao lado, sentido da Praça da Luz, num local lotado de camelôs verdadeiramente achacando eventuais clientes-patos, a fila enorme e vergonhosa. De dar dó. Ao lado carros mal-estacionados, ônibus de excursões sem estrutura, montoeira de vendedores de tudo quanto é bugiganga. Nenhum fiscal, policial, sequer os da indústria de multa. Descaso público total. Crianças, jovens, idosos, estatutos ético-humanistas à parte, foram na fiuza da propaganda enganosa e ali estavam perdidos e entregues aos desmandos generalizados, mais o preços-roubos dos vendedores mal-encarados em contrabandos informais ou no neoescravismo das terceirizações invadindo cafundós, filas, ermos e sombras. E os direitos humanos dos fileiros interessados em cultura?. Vão sacando.Quase uma hora na fila da incompetência estrutural. Sol de rachar mamona, calor doentio, perdição de tudo quanto é tipo, poluição humana dos piores elementos mercadores possíveis, mau cheiro de fedô e chega gente perdida, sai gente frustrada, quando, a bem da verdade, nem poderia em tão pouco tempo e pouco espaço organizacional ter ônibus do interior em tamanha bagunça técnico-administrativa. Deveria ser proibido. Era pegar ou largar. Desordem e reclamos. Chegando ao lugar do filtro com catraca, fila mal arrumada pra pegar um bendito tíquete, quando uma moça nervosinha da silva e amadora para o contexto também pouco funcional, queria tirar-me a bolsa de mão na marra, como se fosse mochila. Tive que, cidadão-contribuinte peitá-la sob o vezo ético. Degradante. Constrangedor. Não sabia a diferença entre uma coisa ou outra. Cabide de empregos desproposital? Aliás, não podia nada quando tudo é cultural e educação faz gosto. Ver pra crer.Aí era esperar o elevador-dinossauro. Sem ascensorista, um guardinha que ia e vinha, coitado, entre atropelos, avisou depressinha e sufocado pela mixórdia generalizada que era para irmos direto e reto pro primeiro andar que o segundo e terceiro estavam lotados. Acredite se quiser, mais o bicho velho subiu diretinho rangendo o peso morto exatamente para o terceiro andar e ninguém apertou nada. Inaugurar obras de supetão para mostrar que é o que não é, é ridículo. Os desgovernos tucano-liberais nunca fizeram nada pela cultura, nem pela educação, porque aquela obra populista e eleitoreira então? Mas ali estávamos e fomos ver o desboque. Uma ou outra coisa trivial e comum que prestasse, ainda assim mal-e-mal visto de passagem. O inédito e supostamente novo, nem é tão novo, pioneiro, inédito ou de vanguarda assim. Confusões de sons e letramentos como macadames. Gírias imperfeitamente incorretas e politicamente obtusas. Os poemas pintados num corredor demasiado estreito até que ficarem bem, apesar das escolhas poéticas bem suspeitas e também até umas letras de mpb bem jecas totais. Pior: o padrão global tornou pífia a minha expectativa. Já pensou? Tevês e tevês. Nada de novo no óbvio. Pouca tecnologia de ponta que causasse interesse, nem ninguém para ordenar interesses de usuários curiosos. Poemas nos tijolos entre lixões. Coisa bobinha de dar dó. Não acrescentou nada a nada. Plínio Marcos iria morrer de ir. Pobre Sampa. O tal olho mágico que mostrava o diferente no longe foi razoável, mas, acreditem, algo pueril no lúdico de percurso entre tarecos. O espelho de se ver o texto ao contrário na água foi uma boa idéia pingada ali no contexto todo. Criações em saquinhos pendurados no ar. Não acrescentou interesse aproveitável que fosse. Telas-panos corrigidas do Guimarães Rosa. Por que não as consertadas, páginas especiais, com mais historiação sobre um dos maiores autores brasileiro? Para não dizer que faltou Machado de Assis e grandes poetas em exposições por atacado. Esperava mais. Mas não mais do mesmo. Ninguém para ciceronar. Sons e imagens numa mistura ruim para o ler/ver (pensar/sentir) literatura, palavras, sons. Um achado fraco e o pessoal que criou o tal museu não foi fundo, com suspeitíssimos nomes (artes?...) ali de quem chegou indagora, talvez, num crescendo nem chegará perto do Machado e Guimarães, mas já estava inserido ali de alguma maneira suspeita, e assim também esteve bolando o projeto em que se incluiu. Difícil acreditar, não é?. Tráfico de influência ou intermediação de foro íntimo e interesse próprio, midiático-editorial, via padrão global por isso mesmo no geral rastaquara, bobinho na resultante final, nota seis, se tanto. O espaço até exíguo, assim mesmo exigia mais capricho, coragem limpa, lúcida, criativa. Criação fora de série não faz mal a ninguém. Museu que já nasceu velho. Da Língua indizível que ali foi prostituída de alguma forma. Portuguesa mas nem tanto. Um museu de blefes, chinfrim mesmo. Oswald de Andrade e Mário de Andrade, da semana da Arte Moderna (1922) teriam vergonha. Faltou palavras. É um Museu a la Faustão: grande e vazio, esteticamente sofrível e vernacularmente arigó. Na mídia, mas, só tamanho não é documento artístico-cultural-humanista, nem cult. Por que a UBE-União Brasileira de Escritores não peitou o açodado projeto, se tem mais cabedal histórico, acervo e lastro?. Eu não gostei. Senti uma frustração geral entre pessoas da classe A e B, com a C e D acreditando mais na propaganda do que na arte e na cultura e na língua propriamente dita. Aconselho os amigos interessados em qualidade cultural, a visitarem a maravilhosa Pinacoteca. O tal Museu da Língua Portuguesa, perto da Pinacoteca é um beco de nadas e ninguéns, um cortiço de toleimas pseudocriativas imprestáveis na geléia geral, grosso modo, um gueto de modernosos que, depois que deixar de ser moda nodal, entrando uma gestão cultural séria, visionária - ai de ti paulicéia desvairada - vai demolir tudo e mandar recomeçar do zero, pois, afinal, depois que vi o ralo e raso e, portanto, claro, não vi algo de nada, fiquei com a impressão que fui logrado por algum motivo, de alguma maneira. Grátis é caro. Entrar na fila quilométrica para ver um amontoado de imagens e palavras que não colam, tudo aquilo com a cara do Fantástico pareceu-me um ledo engodo. Faltou luz criativa ali em frente a Estação da Luz. Será que tem gente que não enxerga no claro?Em ano de Copa do Mundo, de brasileiro no espaço e de eleições, parece discurso ímprobo jogado fora (como erário é espaço público inaproveitado - e falsa cultura literária também jogada fora), cabeças vazias pensando que são o que não são, jogo de cena para ganhar espaço na mídia com arte que não pára em pé. Bola fora mesmo. Pariram um elefante branco lítero-cultural. O lixo não pode ser pseudopop com erário público.E ainda ouvi dizer (ou ouvi sentir, ouvi soar em ouvidos de mercadores) que a sagrada Maria Bethânia podia ser captada na balbúrdia da feira declamando Fernando Pessoa. Será o impossível? Quem gostou é mal formado.


-0-


Poeta Silas Correa LeiteCrítico Social, Jornalista Comunitário

Pós-graduado em Literatura na Comunicação (ECA), e Direitos Humanos e Democracia (USP)

E-mail:
poesilas@terra.com.br
Autor de Porta-Lapsos, Poemas, 2005

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Se Eu Pudesse Pedir Perdão




::Crônica:
Se eu Pudesse Pedir PerdãoPor Silas Corrêa Leite


Se eu pudesse pedir perdão...por alguma coisa, algum motivo, alguma razão limpa, talvez pedisse ao meu querido pai, principalmente por não tê-lo compreendido exatamente como deveria, e poderia então, pra perdida sorte minha, ter sacado muito bem e antes de sofrer tudo o que sofri; e teria certamente evitado descaminhos, e talvez assim, de alguma forma (doces memórias) e com revisitada imagem dele, os meus destemperos doessem menos no meu peito entrevado, e agora eu tivesse menos marcas das sinuosas trilhas, e assim eu tivesse ainda mais plenamente as asas da saudade dele sobre mim, como uma benção dos céus distantes.Se eu pudesse pedir perdão...por alguma coisa, algum motivo, alguma razão limpa, talvez pedisse perdão à minha pobre mãe velhinha, principalmente por ter deixado o nosso lar-doce-lar muito cedo, cedo demais (cedo para sempre) - cortei minha infância pela metade - e caído afoito nas garras de gavião do destino insano, e, em vez de aprender com gestos, sanções, atitudes e eventuais surras de falácias caseiras, as lágrimas dos céus me aconteceram bem mais cedo do que eu pensava e esperava, e eu pude compreender (e posso traduzir tristemente isso agora em banzos-blues), que o amargurado que me tornei, além de algum eventual improviso de jazz com solo de tristices, foi ter tomado peito muito precocemente para enfrentar a barra de viver (a barra pesada de viver), e ter caído no rocambole do mundo como um inocente puro e simples, mesmo as mãos limpas, o peito arfando, os olhos viçados, isto é, simplesmente uma frágil folha de papel rasa em que a vida pôs a malvada descompostura dela, o que me tornou também sofredor precoce, depois refém da sensibilidade extremada, com muito déficit afetivo, e eu lamentavelmente pude, assim, de alguma forma, ser abatido, predado, sofrido, tornar-me - na fuga! na fuga! - um poeta com sânscrita identidade de humildes como licor de jabuticaba de terceira dimensão em realidade substituta.Se eu pudesse pedir perdão... por alguma razão, loucura, ou macadame de sofrência, eu pediria perdão às minhas adoráveis seis irmãs, não apenas por tê-las amado tanto, mas por não ter tido competência para tê-las defendido como deveria, e também por não estar presente ainda mais como o outro seio secreto delas, amparando as ocasionais angústias e perdas, carregando as sobras de tantas tintas intimas das vaidades exageradas delas, ou colhendo mais dos filhotes-sobrinhos belos e abençoados que me deram quando eu era peregrino fugidor, e por isso, intimamente por isso eu as amei muito, amo-as mais do que posso traduzir, e as amarei muito além do lar infinital do dono do sol, quando, finalmente e então, os meus globos oculares já com saquinhos de chá sobre as pálpebras inferiores disserem de meu quase um século de vida, e eu poder dizer Adeus para ver o remanso do último lírio selvagem da terra, e então poder ir, finalmente, colher estrelas no campo de estrelas do céu com meu finado genitor, porque, assim também, claro, no vislumbre do reencontro, sei que na casa de meu pai há muitas moradas.Se eu pudesse pedir perdão...de alguma forma, de alguma maneira, em algum estágio e devão desse erradio caminho (de caminheiro atiçado pela busca de um farol além da curva do arco-íris), eu iria pedir também que me perdoassem tantas coisas, nesse favo de inventário e partilha, a saber:Um: Eu pediria perdão aTodas as ruas de minha infância, principalmente aquelas com terrinhas cor-de-rosa de minha descalça pegada íntima, na liberdade de ser puro entre aurorais, encantários, ninhais, e, claro, também, mandorovás, camaleões e fantasmas verdes entre beronhas e formigas-saúvasDois: Eu pediria perdão aTodos os quintais das casas de cigano aonde morei, nessa e em outras vidas antigas - ah a aurora que trago da infância! - entre dormentes, trilhos, tatus, canteiros, pardais & cidreiras, porque de eios de água brotaram imaginações saradinhas como cuques de framboesas temporãsTrês: Eu pediria perdão aTodos os milhares de livros que eu li, porque neles, pelo menos assim em tempos de vacas magras, todos os finais eram magnificamente felizes, o Crusoé era uma gaivota santa numa ilha de nascentes limpas, e eu imaginava que, sendo eu mesmo, sempre, teria santerias por atacado nas minhas aventuras de atiçado, sensível, quase um Sentidor da pá viradaQuatro: Eu pediria perdão aTodas as mulheres que eu amei, e que não me amaram, e que assim e talvez por isso mesmo foram infelizes para sempre, como uma desculpa-livramento, um castigo-andaime, uma solidão-palhaço, um prelúdio-talismã. Até porque, confesso, o meu primeiro amor foi uma parede. Que eu trago e tenho comigo, como um íntimo butim, como um alforje de estrelas que despenco cada vez que escrevo. E eu escrevo para não chorar. E eu faço poemas porque não sei morrer sozinho como uma lesma cega cor de leiteCinco: E pediria perdão porTodos os malditos(..) sonhos que eu tive. Eu, tolo, achava que iria crescer e mudar o mundo. Só os imbecis são felizes? Primeiro queria ser presidente, depois poeta, afinal restei-me educador. Como viram, nunca soube me escolher na melhor parte do filé das víboras, nos tapumes dos chacais, nos guizos dos incrédulos. Fui, perdoem, cem por cento eu mesmo e todo emocional como um baú de estimas. Deus sabe com quantas lágrimas faz o castelo de nossas idas e vindas (não há perdão no esquecimento)Seis: Eu pediria perdão aTodos os inimigos, e circunstancialmente os tive em algum lugar ou vareio de palavras, e que por algum motivo me magoaram, me traíram como margens abruptas de um rio inocente. Alguns eu perdoei como se perdoa um esquilo cego por morder seu calcanhar de Aquiles, a outros eu acabei por - moendas do estilo da vida nua e crua - a dar pão e água, e, confesso, muitos eu matei tanto dentro de nim como um surto-circuito, que eles mesmo se anularam com seus nós íntimos, como cactos vítreos de rudezas pegajentas em clãs espúriosSete: Eu pediria perdão aTodos os anjos que me ajudaram, e que devem me perdoar mesmo para muito além do eternamente, porque, aqui e ali, nalguma curva do caminho, sem o saber, sem querer e mesmo sem maldade, eu os abandonei entre um mata-burros, uma pinguela ou um portal. E há lugares (o mundo sombra?) que anjos não freqüentam. E eu atinado fui buscar candeeiro na boêmia, troçando alhures (troféus de mixórdias), trocando flores por cançonetas, amando tardes de chuvas e minguados afetos de ocasião, quase purgando interioridades com primaveras que já deram o que tinham de darOito: Eu pediria perdãoPor todas as preces, todos os brancos lenços de adeuses (até os escondidos), todos os poemas escritos na mais cuneiforme intenção do refluxo do inconsciente - que é quando eu me despojo, me decomponho, pondo a alma para respirar - escrevendo de supetão o rebite de uma idéia, um ideal, entre um copo de leite azedo, um mimo celestial ou uma pestilenta tentativa de abismo que escrevendo evito um poucoNove: Eu pediria perdãoA todas as árvores que fui, de alguma maneira e por algum motivo, medidas as proporções, de groselheiras secas a laranjeiras sem guirlandas brancas, como se um dia, de verdade eu tivesse sido alguma espécie de árvore, noutro século, noutra encantação, e, por algum fruto proibido vim a ser vetado de ser outra vez, depois espiritualmente perdi o sagrado direito de tê-las comigo no DNA, e aqui me deixaram em dimensão-placenta errada, não apenas como um castigo pro carbono virar diamante, ou não, mas para como, tentativa de cicatriz, eu de novo aprender a ser raiz, a ser copa, a ser tronco, a ser pétala, a dar flores & frutos, tudo de novo, tudo outra vez, como uma canga, um pesadelo vivido, no arremate de uma alma superior cerzindo minhas perdas entre ofícios testamenteiros e arrozais de desculpas com azedumes terçãsDez, finalmenteEu pediria perdão, ainda, nesses meus dez mandamentos-testemunhos (?) de desalinho e dor (poetas não têm peças de reposição), a àquilo que fui de alguma maneira, por algum motivo, sem o saber, sem o querer, sem o poder, mas identificando afinidades íntimas:-Cardume: Por ter sido um pouco areal, um pouco atol, um pouco rede, um pouco albatroz no mar de sargaços da vida, então paguei a duplicata da perda a ser isso também me serviu como lima nova em ferrugens adquiridas-Tempestade: Por ter navios fantasmas em mim, ser sobrevivente de naufrágios abismais, trazer estranhas marcas disso, fui isso e me feri de ver o que provoquei em ira insana, atemporal, obedecedor involuntário de desastres e tragédias-Chuva de abril: Por saber que nada me pertence, nada do que me foi dado é gratuito, tudo tem um preço e eu não acredito em valores a não ser o lado pérola da ostra, por isso pago dobrado esse crime de existir em Nau Catarineta errada, indo e vindo, carpinteiro das águas no teatro de absurdo dos ciclos que jamais dominarei-Cisterna: Porque ainda tenho lágrimas para tornear poemas por séculos e séculos, não tendo medida para a minha tristeza terreal, e nem me sabendo livro aberto em página errada, assim nunca poderei ordenar à dor que saia para sempre de mim, mesmo que eu ande pelo vale da sombra da morte...-Deserto: Porque sou solitário como uma nave sideral pirata clonada de outra banda cósmica, e solitário me tenho como ser espúrio em vinagre vencido e injusto dessa existência pagã, então escrevo para não ficar louco, escrevo porque o meu cálice transborda e ninguém tem piedade por eu ser como porta-lapsos em núcleo de paradoxos-Eco: Tudo o que sou, soa alto e claro, o que não sou, não sabendo inteiramente me assusta (cacos do espelho), então eu peço perdão por ter amado de repente quem não devia, dito adeus quando era para ficar estagiário, aprendido ser leitor de tudo quando deveria ser plantador de campos de lavandas em outros mundos em que a morte não existe.-Barco encalhado: Isso eu sou e serei por muito tempo, mesmo não tenho ainda inteireza do que isso me representa ou me servirá, até porque, em frente ao mar eu me sinto o próprio mar, como se a mãe-natureza me fizesse carbono do sal marinho, depois gaivota número um, depois ilha de areia, depois pobre foca, até que eu perdesse asas ou guelras, até que eu pudesse nadar e ser átomo, esporo, pólen, e chover na horta da espécie humana com seu bezerro de ouro, entrando então pela porta dos fundos da existência só para exatamente pôr o dedo nessa ferida acesa que é o tão mal conjugado verbo viverE, por fim, perdoem musas e boêmios, perdoem anjos e vigiadores de quarteirão, eu me resto aqui um aprendiz de tudo, entre um vazio e o vácuo, criando borboletas de palavras, sendo sempre um homem fora do meu tempo.Quando eu era piá de tudo, amava estar com os idosos tão sábios. Agora que estou quase velho, adoro lidar com crianças.Sempre achei, aliás, que iria morrer muito cedo e criança.Espero morrer criança com quase cem anos.E que Deus tenha piedade de nós.À bença, Mãe. Ave Estância Boêmia de Itararé.Porque Hoje é Sábado, aviso aos incautos navegadores de primeira hora: Bolinhos de chuva encharcam com cervejas bentas, e criam mais tecido adiposo nas vaidades herdadas.

Silas Correa Leite – Santa Itararé das Letras
E-mail:
poesilas@terra.com.br
www.portas-lapsos.zip.net
Autor de CAMPO DE TRIGO COM CORVOS, Contos, Editora Design
À venda no site:
www.livrariacultura.com.br

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Mensagem de Natal 2009 - Silas Correa Leite




Mensagem de Natal

DEZ DICAS PARA O NATAL E PARA SOBREVIVER EM 2.010


(Primeiro Tratado de Primordiais Virtudes Básicas)


01)-Lembre-se sempre que você estabeleceu metas antes mesmo de começar a existir.

02)-Nunca respeite seus limites circunstanciais de trajetos cósmicos. Na dúvida ou em dezelo íntimo, aprenda a fazer biscoitos de prelúdios silvestres.

03)-Escolha estrelas-referenciais com alto estilo. Faróis humanos são abençoados, mágicos, brilhantes. Farão você se encontrar em você.

04)-Procure o seu mais puro e devido lugar de muito bem ser, para então ser muito bem e crescer nesse seu espaço todo próprio de se existencializar. Alguns chamam isso de lar. Mas um grande amor também pode ser um lar. O seu melhor lugar-lar é dentro de você mesmo. Seja feliz no seu estar em si.

05)-Não tenha horário para nada. Tenha sintonia. E se tiver, relaxe e goste. Tudo é lição de passagem. Ame amar o amor de cada momento todo seu de ser estar e permanecer-se.

06)-Leve seus assuntos íntimos e pessoais para passear com você, mostre os caminhos, as trilhas, os relevos, e quando for dormir, esgote seus pesadelos entre o vermelhão dos extintores de incêndios dos anjos.

07)-Aceite palpites mas teste-os sempre em você mesmo, no amor e na dor, na alegria e na tristeza, no claro e até no clima ambiental de média luz.

08)-Não acredite em tudo. Desconfie até de você mesmo. Não queira ser o que você não é. Não queira ser o que você não saberia ser, nem agüentaria suportar o tranco de ser no futural. Faça bem para você mesmo, fazendo bem aos outros no entorno. Sempre ficamos em paz conosco quando nos fazemos um bem amplo, humanista e territorial.

09)-O mundo inteiro é seu professor. Saiba ser eterno aprendiz. Seus problemas são seus professores. Aí incluindo inimigos, situações-conflitos de riscos, solidões coivaras, músicas da alma, diferenciais de rotas improvisadas, pragmatismos, atropelos, vazantes lacrimais.

10)-Vida é treino. Viver é estar no apuro do esforço físico, mental, emocional e espiritual de lapidação. Viver é, assim, estarmos sempre afinando instrumentos de capacitações em estúdios abertos de nossos espíritos peregrinos.
-0-
Feliz Natal 2009 – O Ano Que Vem Vai ser Dez
Silas Correa Leite – E-mail:
poesilas@terra.com.br
Site: www.itarare.com.br/silas.htm

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Servidão - Letra de Rock/Poema de Silas Correa Leite





Letra de Rock (Quem Se Habilita a Musicar?)


Servidão


A servidão voluntária dos grupos
Tribais,
Sexuais,
Sociais
Cabeças vazias arrotando culpas
Sintomas de subcretinos insensíveis quase
Canibais


Todos submissos, pífios, incultos
Amorais,
Animais,
Consensuais
Mentes vagando no nada absoluto
Cotas de sem cérebro, hipócritas, janotas
Boçais


A servidão de condomínios insepultos
Letais,
Fecais,
Presenciais
Tribos, grupos, panelas, totens, posudos
Chacais


A solidão voluntária da falta de escrúpulos
A solidão voluntária da falta de escrúpulos
A solidão voluntária da falta de escrúpulos
-0-
Letra de Rock/Poema: Silas Correa Leite
E-mail:
poesilas@terra.com.br
www.itarare.com.br/silas.htm

domingo, 29 de novembro de 2009

Resenha Crítica de Teresinha de Oliveira Ledo Kersch, do Texto CAMELO de Silas Correa Leite



Resenha Crítica:
A Perspectiva de um Camelo ao Olhar para o Oriente

LEITE, Silas Corrêa. Camelo. In: O homem que virou cerveja.
São Paulo: Giz Editorial, 2009.

Silas Corrêa Leite é natural de Itararé, São Paulo, e já publicou textos críticos, sátiras, ensaios, crônicas, contos, poemas, entre outros escritos, em aproximadamente 500 sites brasileiros e estrangeiros. Escreveu O rinoceronte de Clarice, um livro interativo que foi objeto de diversos estudos acadêmicos, dentre eles uma tese de doutorado na Universidade Federal de Alagoas. São de sua autoria os livros Porta-Lapsos, de poemas; e Campo de trigo com corvos, de contos.
O texto Camelo foi publicado inicialmente no site do Jornal O Estado de São Paulo e posteriormente passou a integrar a coletânea de crônicas intitulada O homem que virou cerveja, publicada em São Paulo pela Giz Editorial, em 2009. O referido livro é resultado da premiação do autor em primeiro lugar no “Concurso Valdeck Almeida de Jesus”.
A crônica é narrada em primeira pessoa, no tempo presente, por um camelo, narrador-personagem do universo oriental que dialoga com um provável leitor ocidental, provocando-o para que este saia de sua passividade diante dos fatos que o cercam e assuma uma atitude mais crítica, sobretudo em relação à constante violência que assola o planeta e às recorrentes guerras no Oriente, muitas destas resultantes de ataques oriundos do Ocidente.
O texto surpreende desde o início, a começar por este narrador inusitado, que observa o que acontece ao seu redor e revolta-se contra as injustiças cometidas pelos seres humanos, dos quais se esperaria certa racionalidade. Entretanto, esta vem justamente do camelo, através da reflexão e análise da realidade e da manifestação de suas ideias. Já no primeiro parágrafo, o leitor é convidado a pensar sobre as vítimas inocentes das guerras, principalmente nas constantes lutas travadas no Oriente, muitas destas protagonizadas ou apoiadas por líderes políticos ocidentais:

Pois é, mano, você que é um baita animal racional, de capacete, carcova, gravata, dólmã-de-tala, elmo ou turbante, deve estar aí se assuntando com esse deserto de acontecências ao deus-dará, a bem dizer, entre atropelos de idas e vindas aceleradas, nuvens de areia, torres pegando fogo, crianças inocentes explodindo, mulheres grávidas vitimadas, prédios de instituições civis se desmontando [...]. (p. 39)

Este camelo-narrador conduz o leitor à visão dos horrores provocados pelas guerras, realizando sua travessia pelo espaço desértico e descrevendo o que observa. Segundo Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, em seu Dicionário de símbolos (1996), o camelo, por ser uma montaria que auxilia na travessia do deserto, conduzindo o homem de um oásis a outro, possibilita o alcance do centro oculto, da Essência divina. Nessa perspectiva, o camelo-narrador cumpre sua função, pois desperta a sensibilidade dos leitores para situações vivenciadas por inúmeros seres humanos, devido à guerra, e mostra que, ao aceitarem passivamente tais circunstâncias, não deixam de compactuar com esta realidade. Ao despertar para o sofrimento alheio e se interessar por ele, de alguma forma o leitor aproxima-se da Essência divina.
Nesse sentido, há um convite realizado pelo narrador para o leitor, sobretudo o ocidental, a fim de que este saia de seu lugar confortável de observador e entre em contato com a alteridade, com o Outro, respeitando seus valores e crenças e não se colocando como alguém superior, detentor das verdades absolutas, atitude que muitas vezes justifica atos violentos, como as guerras. Considerando as contribuições teóricas de Lévi-Strauss acerca do etnocentrismo, em textos como Raça e História (1952), pode-se dizer que o camelo propõe que o leitor abandone uma visão etnocêntrica, que enxerga o outro a partir de seus próprios valores, e adote uma postura de respeito à diversidade.
As descrições realizadas pelo camelo contam com o auxílio de dois outros animais: a águia e o gafanhoto, que lhes relatam acontecimentos de lugares por onde ele não passa. Se recorrermos mais uma vez ao Dicionário de símbolos (1996), observaremos que a águia constitui o mensageiro da mais alta divindade, ao passo que o gafanhoto tem um simbolismo ligado a pragas e devastações. Esta dualidade também é uma característica do próprio camelo-narrador. Este, assim como o gafanhoto, tem os pés firmes num chão inóspito. Além disso, encontra-se diante de uma realidade que o entristece e revolta-o. No entanto, apesar de tudo, assim como a águia, consegue olhar para o alto e sonhar com “um mundo em que todos possam viver em paz”.
Entre suas reflexões, o camelo deseja avidamente ganhar voz através de um “ventríloquo”, “mágico ledor de lábios”, “bruxo sem véus” ou mesmo de um “anjo poeta”. Tal desejo se concretiza, pois o camelo torna-se o narrador de sua história na crônica escrita por Silas Corrêa Leite. O escritor é o “bruxo sem véus” e o “anjo poeta” que possibilita a escritura e a materialização do pensamento do camelo. Há uma fronteira tênue, em que se misturam o narrador ficcional camelo e o autor da crônica, também poeta, Silas Corrêa Leite. As vozes do cronista e do narrador misturam-se, realizando uma escritura bivocal, por vezes ácida, por vezes tomada por profundo lirismo.
No final do conto, há uma provocação ao leitor: “Fique aí, seu camelo engravatado”. Ao ser chamado de camelo e convidado a permanecer onde está, o leitor é convidado a pensar no quanto os seres humanos têm demonstrado menos racionalidade que os animais...
Percebe-se, dessa forma, que o cronista, a partir do relato do cotidiano de um camelo no deserto, capta a essência do sofrimento humano causado pela violência da guerra, de forma singular e instigante, de maneira a levar o leitor a uma reflexão mais profunda sobre esta problemática e assumir uma postura mais crítica e menos passiva diante dos fatos.

Teresinha de Oliveira Ledo Kersch
(Mestranda em Literatura e Crítica Literária pela PUC-SP)

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

H2OUTROS




H2OUTROS


A bomba que te espera
Não virá da estratosfera
Mas do lixo que produziste na primavera
Haverá na terra tanto aterro sanitário
Que até tu otário
Já era

A bomba que te virá
Do céu não irromperá
Mas do pão e mel que faltará
E a fome horrendo que será
A bomba atônita de tua era

Por fim e por fatal mágoa
A bomba da falta dágua
Onde um bilhão de humanagente é pouco
Dois bilhões de gados marcados entre porcos
E a bomba H 2 Outros

-0-

Letra

Silas Correa Leite

Poema da Série: H2OUTROS – Letras de Rock Poemas

E-mail:
poesilas@terra.com.br
www.portas-lapsos.zip.net

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

ENCONTRO DE POETAS EM SP, 21/11, Casa das Rosas, Presença do Poeta Silas Correa Leite





Convite - Encontro dos Poetas Del Mundo do Estaado de São Paulo
Gostaríamos de contar com você nesse evento! Apenas, solicitamos a confirmação da presença, por e-mail, para que possamos relacionar os presentes nas listas de convidados.
Quem já confirmou a presença, não é necessário reconfirmar. Abaixo do convite, segue a Programação. Desde já, agradeço, desejando um abençoado sábado! Carinhosamente, Beth *Elizabeth Misciasci
Programação para 21.11.2009
Encontro do Poetas Del Mundo do Estado de São Paulo
14:00h- Início
Credenciamento
14:30h-
- Cerimonial - Hiago Rodrigues Reis de Queiros, convoca para a Composição da mesa 1
14:40h-
Apresentação dos Hinos
-Execução do Hino Nacional Brasileiro
-Execução do Hino do Chile
-Execução do Hino dos Poetas Del Mundo
14:50h - Abertura
Hiago Rodrigues Reis de Queiros dará as Boas Vindas aos presentes
14:55h -
Elizabeth Misciasci - fala do Movimento Poetas Del Mundo na Cidade de São Paulo
15:00h -
Marisa Cajado, fala do Movimento Poetas Del Mundo no Estado de São Paulo.
15:05h -
Delasnieve Daspet - Embaixadora para o Brasil de Poetas Del Mundo
- Explanara sobre Movimento Poetas Del Mundo, no Brasil.
15:35h -
- Apresentação do Secretário Geral e Fundador do Movimento Poetas Del Mundo, Sr. Luis Arias Manso.
Pronunciamento do Secretário Geral e fundador do Movimento Poetas Del Mundo.
16:05h -
Segunda parte do evento com Show "lítero-cênico-musical"
- Apresentação daquela que é namorada do teatro, tem um caso com a poesia, vive do amor platônico pela música e "arrasta um bonde pela dança": - Karla Jacobina.
16:25h -
Apresentação da Embaixadora dos Poetas Del Mundo na França
- Palestra áudio-visual de Diva Pavesi - Tema: A França no Brasil
17:05h -
Monólogo Cômico
- Apresentação do renomado Dramaturgo Deomídio Macedo, considerado uma das grandes atrações na Fliporto 2008, interpretando o velhinho Baltazar - 90 anos.
17:20h -
Composição da Mesa 2 -Debates.
- Presenças - Paulo Ferraz, José Faria Nunes, Silas Correa Leite, Rosani Abou Adal, Rodrigo Capella, Ricardo Almeida, Miguel Rúbio (Miguelzinho da Vila), Valdeck de Jesus, Roberto Romanelli e Delasnieve Daspet.
Tópicos priorizados
-Postura atual do poeta na sociedade.
-Paradigmas da poesia contemporânea.
-Mercado Editorial para a Poesia.
18:20h -
Apresentação de Stella Vives de Porto Alegre, performista da poeta portuguesa Florbela Espanca.
18:30h -
Lançamento do livro da Poesistas
Lançamento do livro da Poesistas e descrição objetiva, com a apresentação de Hiago Rodrigues Reis de Queiros, também organizador e idealizador do evento.
19:05h -
Miguel Rúbio, declama.
Declamação do Poeta e compositor Miguel Rúbio (Miguelzinho da Vila)
19:10h -
Apresentação Musical.
-Apresentação Musical (som e teclado) da cantora, instrumentista e também poetisa Bia Barros.
19:30h -
Abertura do Sarau por Dora Dimolitsas com presenças ilustres de vários poetas..
20:00h-
Menção Honrosa e sorteio de livros dos Poetas Del Mundo e CDs aos convidados.
20:15h-
Encerramento com a distribuição dos certificados de presença aos participantes e confraternização, por Delasnieve Daspet.
20:55h-
(Agradecimento Poema - Por Delasnieve Daspet)
Elizabeth Misciasci - Jornalista, Humanista, Escritora, Pesquisadora. Presidente do Projeto zaP! *Embaixadora Universal da Paz no âmbito do Círculo Universal dos Embaixadores da Paz.

sábado, 14 de novembro de 2009

Pedro Maciel Fala a Língua dos Deuses, no Romance Assustador COMO DEIXEI DE SER DEUS





Pequena Resenha Critica

__________________________________________


Pedro Maciel Fala a Língua dos Deuses


Em “Como deixei de ser Deus”, Pedro Maciel conversa com Deus e o Diabo. O estupendo e assustador Romance “COMO DEIXEI DE SER DEUS”, Ed. Topbooks, 2009, é o top de linha no atual momento da efervescente literatura brasileira contemporânea. Humor, concisão perturbadora, erudição, alumbramento e ironia, assustadora sonoridade, ritmo e muita lucidez. Máximas, epigramas, aforismos, citações, fragmentos reflexivos contundentes. Muito mais do que isso. Há recursos brilhantes na intextualidade, além de alumbrados estados metafóricos. E muito mais do que isso. Começa a apresentação estética da obra com a capa de um vermelho-diabólico que parte da obra “Desvio Para o Vermelho”, de Cildo Meireles, um dos pioneiros da arte conceitual.

Elogiado entre outros por Moacyr Scliar, o maior proseador brasileiro categorizado por excelência nos últimos tempos, por Ivo Barroso, pelo emepebelizado filósofo multimídia Antonio Cícero, e ainda por Luis Fernando Veríssimo (o maior cronista da imprensa), Pedro Maciel se afirma e confirma em cada trabalho, e todo mundo que entende do riscado surpreendido assina embaixo de que ele é mesmo a mais fina flor da espécie literária contemporânea. Muitíssimo acima da média. Um achado.

Com um seu mundo letral ostentando em esplêndido e magistral imaginário, algo apocalíptico; Pedro Maciel produziu um excelente romance presente-(passado)-(o futuro está sempre em construção), um romance com ecos, estados oníricos, viajações e até certas derramas. Ficção-show.

O pesadelo de Deus. O homem? O espelho? Deus mora nos fragmentos atemporais? Deus, a consciência do homem... Pensamentos, sensibilidades, abstrações – o tripé em que fomenta (fermenta) a obra COMO EU DEIXEI DE SER DEUS. Em entremeios a tudo isso, encantamentos e textamentos. O tempo-rei costurando veios. “Deus, a alma dos brutos”. E os brutos que amamodeiam. Diálogos interligados, incendiando pequenos parágrafos epigramáticos entre reticências, citações e a pólvora do criar se vislumbrando. A arte-pura-provocação. A construção-desconstrução de uma babel íntima? O que foi é. O que será se cabe sendo. Deus não é fóssil. Não é fácil, portanto. O universo mágico da loucura que não é santa e nem se veste de ouro e prata, talvez vermelho-coisal, bezerros de ouro à parte...

O “Bildungsroman” (romance em formação) informa, transforma, reforma, disforma, forma, metamorfoseia. Essas e outras. Idéias? Propósitos? Como um concretismo em prosas. E toma Platão, Heráclito, Beckett, Da Vinci, Dostoiéski. E os livros sagrados, claro, que sem eles não haveria a proposital (?) provação, provocação, ação literária nesse caso de extremidades que se tocam, permeiam, tecem, vazam, desnorteiam.

A “desnarração” sem arames e presilhas como fim, fito e propósito. A voz do narrador (em negrito); a voz que clama no deserto (em itálico): delírios que nada passam a limpo, antes, com e fundem, feito delírios sarados do finito ser que cria o transcendentalizar-se. Será o impossível. Quando se brinca de Deus, com Deus, adeus sanidade. Sorte nossa. Será o impossível? Ah a notável caixa de pandora da literatura dando bons refluxos. Estamos no coração das luzes e não nos enxergamos em nós? A função da escrita enquanto arte é também retrazer o não identificável. Talento tem gerador próprio. É o caso de Pedro Maciel já elogiado por A Hora dos Náufragos (Bertrand Brasil, 2006). Ninguém fica lúcido de uma honra pra outra. A impertinência é que faz a hora, a criação.

Pedro Maciel é sim um puro “neoriobaldo” em contracorrente: “A gente vive pra desmistificar”. E administrar as contundências dos mitos também. Entre o sótão e o porão de si mesmo (tantos sis em si), Pedro Maciel maravilhosamente desestrutura o osso de ostra do romance formal. Um de-quê de Borges, de Garcia Marques, de Cortazar, de Kafka Lispectoriano... E ainda assim, o lugar de si tem cabimento.

O romance que se atirou frente a janelas de alma-mente-coração. A alma diversa. A vida (vida?) diversa. Um romance que diz versos. Janelas de fugas criacionais. Quase pequenas pinceladas multi-historiais. O não lugar, o são ser, os não personagens. Deus e o diabo na terra do nunca, na terra do Self. E escurez. Sozinhez. A originalidade da obra clássica de Pedro Maciel surpreende, assusta, intriga, corrói (des)valores, desmistifica, toca o indizível. Toca circuitos, escritas.

Vejam/leiam os “joios” preciosos:

“Ontem visitei a cidade em que nasci; ninguém me reconheceu(...)/deuses não têm Deus quando lembram do homem(...)/Se Deus existisse todo mundo ficaria sabendo(...)/Há cabeças que mesmo cortadas emitem pensamentos(...)/Pelo amor de Deus se vai ao inferno(...)/A linguagem sempre esconde o pensamento(...)/O homem pensa e Deus ri(...)/Quando nasci os deuses já estavam mortos(...)”


-0-

Silas Correa Leite, Santa Itararé das Letras, São Paulo
Teórico da Educação, Conselheiro em Direitos Humanos, Jornalista Comunitário, Poeta, Contista, Resenhista, Ensaista e Crítico. Autor de Porta-Lapsos, Poemas, e Campo de Trigo Contos (finalista do Prêmio Telecom, Portugal), a venda no site:
www.livrariacultura.com.br
E-mail para contatos: poesilas@terra.com.br
Blogue premiado do UOL: www.portas-lapsos.zip.net

Surpreendente Romance SOL NEGRO de Augusto Ferraz






Pequena Resenha Crítica (Primeiro Rascunho)


As Clarificações Literárias do Estupendo Livro SOL NEGRO de Augusto Ferraz



“A ausência de uma coisa não é somente isso,
não é apenas uma falta principal, é uma
subversão de todo o resto, um estado
novo impossível de prever no antigo”

(Marcel Proust)



O Livro SOL NEGRO, de Augusto Ferraz (Nossa Livraria Editora, 2008, Recife-PE), é um belíssimo e surpreendente entrecortado de interessantes intertextos (e paradoxal a partir do nome, inclusive), entre contos-poemas, contos-narrativas, contos-despojos, contos-arrebentações (e arrebatações?), contos reflexões (algo assustadores, quase todas), feito devaneios literários de alto estilo. Como classificar uma bela loucura criativa de tal obra-livro?

As narrações extremamente ousadas e criativas do autor de SOL NEGRO, é a primeira coisa que clama atenção, logo cativa, eleva, faz o leitor pensar com pose sobre o que lê (e se sentir privilegiado de estar lendo literatura de alto nível). A intensidade do que se lê na intertextualidade que não se nomina, mas evoca sentimentos, sensibilidades e embebeda. Prosa poética de grosso calibre, por assim dizer.

Há em todo o Sol Negro de Augusto Ferraz uma espécie de neoexpressionismo, tudo muito denso, as cantagonias, as cisternas íntimas muito bem revisitadas pelo autor. Há cantos, êxtases, epifanias, prosas aqui e ali apocalípticas, homens e bichos, sintonias e ceifas, searas e intimidades, sítios e situações. A morte, a vida, o caos, o urbano o periférico, o rural, o encantado. Tudo iluminado com muita maestria poética no narrar.

A enumeração sequencial dos textos (partículas) sem nome, datando cada texto-conto (?), aqui e ali um susto, ou um apaziguamento, ou um “salmar” de algum modo que seja, entre uma surpresa, um susto, um gosto de raiz, de terra ou de sangue, tal a qualidade de mão cheia. Já pensou? Tardes e manhãs. Iluminuras. Mendigos, mortos, chuvas, desnaturezas. Oceano, cemitério, borboleta. Vidas humanas viçadas. Augusto Ferraz clarifica a escurez da vida, dos seres, dos sobreviventes, dos miseráveis. Bestas, dragões, tudo indo de roldão na sua pena criativa em altos vôos.

“Abro os olhos no meio da noite e o olho do tempo fecha-se sobre mim. O caos é a brasa da fogueira que se apaga(...). Fecho os olhos no seio da tempestade e contemplo a noite que há em mim.”

Bravo! Lindeza. Ah as prazeiranças e contentezas do artista letral, como dão prosa poética com asas... O SOL NEGRO é uma espécie de salvação da lavoura literária nesses tempos realmente muito pouco criativos, entre modismos, panelas e núcleos de abandonos e desprezos entre os salvos do incêndio e os que se agrupam em sulistas nichos midiáticos pouco férteis.

In, A Necessidade da Arte, Ernest Fischer nos diz “O Homem sempre se verá como parte da uma realidade infinita que o circunda, e sempre se achará em luta contra ela(...). A magia da arte está nesse processo de criação, mostrando a realidade como possível de ser transformada, dominada, tornada brinquedo(...). A arte como um processo de identificação(...). Somos um pouco criadores de obras que estendem nossos horizontes e nos eleva acima da superfície a que estamos pregados(...)”.

Augusto Ferraz é exatamente isso. Em algarismo romanos os contos (que sejam) surgem clarificando idéias, momentos, situações, muito além de limites (porque ousa a imaginação e o conhecimento do oficio de escrever), recuperando quadros cênicos.

“A tua palavra faz os mortos vestirem a fantasia da vida (in, pg 36)/ Palavras luzem como um sonho pendurado na parede da noite (pg 64)/ O flagelo santificado no prazer da carne (pg 97)/ Ela não resiste e embala-me a insônia como que acendo as estrelas nos cantos escuros do sol (pg 129)/ Um anjinho de lama, descido do purgatório ficava lá dentro das tocas dos guaiamuns (pg 153)/ A arvore que és, nasceu no meu peito(pg 162)”.

Todas as escritas de Augusto Ferraz são lindas, porque bem criadas, sentidas, revivificadas na sua bagagem de vida, de leitura, de seu sentir com a imaginação, de seu pensar empa-lavrando. Quem sabe se, a terra não é apenas um mero aterro sanitário do cosmos, onde aqui podem estar depositados todos os vermes?

Sim, é preciso clarificar a vida bela e a vida suja, a beleza e a tristice, a dor e o amor, o humor e o ódio, as disparidades e as coincidências, os paradoxos e as matizes, o que há de poder ser aproveitável na arte, na prosa, prós e contras enfim. E isso está na ótica e na mão do artista escrevendo seu tempo, no amor e na dor. Nínives e Gomorras. Há tambem no entremeio das narrativas um de-quê meio bíblico. A sintonia divinal no conto/canto CV é linda:

“Essa noite, dormi como um anjo. Sonhei que te amava. No sonho, eu vivia. Na verdade a vida é um sonho, e se eu sonhava é porque te amava. Amar-te não é um sonho, é a realidade. Louco de amor, o amor em ti enlouquecia, enquanto eu sonhava, o anjo me dormia”

Ah as entranhas do homem (Nelly Novaes Coelho).

Lendo Augusto Ferraz de alguma maneira enloucresço. Também pudera, com essas contações mexendo com os “sagrados” laços dos entes, mitos, abóbodas, céus, mistérios, ramificações... terra chã...

Sim, mexer com tantas loucuras-contações ao mesmo tempo é um vespeiro. Augusto Ferraz abre as portas da mente, do céu, do Self. E destila as escritas. Na casa do pai há muitas erratas?

SOL NEGRO não perdoa nadas e ninguéns. E se deixa sangrar com tantas tintas.

Disse Kateb Yacine:

“É preciso que nosso sangue se inflame
E que nos incendiemos
Para que os espectadores se comovam
E o mundo abra enfim os olhos
Não sobre nossos desejos
Mas sobre as chagas dos sobreviventes”
....................................................................

“Um dos traços essenciais da literatura na sociedade dita pós-moderna, consiste na rarefação dos gêneros, na interpenetração dos modos, na mistura arbitrária de espécies e modelos literários, numa constante e ousada intertessitura das formas (...)” disse Hildeberto Barbosa Filho, no próprio Prefácio do Livro Sol Negro, “Raro Encontro da Poética com a Beleza”.

Augusto Ferraz na verdade introspectou um mundo louco, um mundo meio Dublin, vidas do norte, um mundo irado em suas evocações, mas um catado e entrecortado mundo literal mesmo todo seu. O homem é o destempero de Deus na “herrança” da criação? Ora, sob a ótica de Darwin, quem mandaria Deus pentear macacos?

Para um artista de peso, viver não é só abanar o rabo.

Há que se registrar as acontecências. Tudo pode ser ou não ser. Eis questão. Ler “SOL NEGRO” de Augusto Ferraz é fazer um mosaico que está na prestação de prós e contras. Escrever é colocar luz nas bocas dos mistérios desses brasis em recantos e rebentos de palhoças gerais...

Literalmente, sem tirar e nem pôr, Augusto Ferraz escreve loucuras santas pelas linhas das tortuosas vidas, arrebentando conceitos estruturais de narrativas padrões. Um Augusto Ferraz gauche?

Bingo. Ou, quero dizer, eureka.

Augusto Ferraz SOL NEGRO fez um puta livraço.

A vida está nua e crua, escancarada. E ainda assim poetizada no que há de mais belo e cheio de ternura e encanto.

Acerta em quase tudo, só fugindo das regras que nomeassem o próprio criar diferenciado. Afinal, nem toda escrita sem uniforme são oráculos.

-0-

Silas Correa Leite, Santa Itararé das Letras, São Paulo
Teórico da Educação, Conselheiro em Direitos Humanos, Jornalista Comunitário, Poeta, Contista, Resenhista, Ensaista e Crítico. Autor de Porta-Lapsos, Poemas, e Campo de Trigo Contos (finalista do Prêmio Telecom, Portugal), a venda no site:
www.livrariacultura.com.br
E-mail para contatos: poesilas@terra.com.br
Blogue premiado do UOL: www.portas-lapsos.zip.net

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Romance A Espera do Nunca Mais, de Nicodemos Sena

LITERATURA / Resenha crítica

A Espera do Nunca Mais, de Nicodemos Sena – exemplo de como a literatura de ficção pode reordenar e recriar a ‘realidade’


Por Rodrigo Felix da Cruz*


Publicado em 1999, quando seu autor, Nicodemos Sena, completara 40 anos de idade, A Espera do Nunca Mais é uma saga amazônica ocorrida entre os anos 50 e 70 do século XX, que retrata a luta do povo amazônico frente aos desafios político-econômicos. História de índios e caboclos que lutam contra a exploração humana e a destruição da floresta: a luta dos oprimidos contra os agentes do Capital.
Embora seja um livro de estréia, A Espera do Nunca Mais (Ed. Cejup, 876 pág.) trouxe para seu autor o imediato reconhecimento da crítica, a qual, nas páginas de grandes jornais do ‘eixo’ Rio/São Paulo, reconheceu-o como a grande revelação da ficção que se fez na Amazônia brasileira na virada do século. Em 2000, A Espera do Nunca Mais conquistou o prêmio Lima Barreto/Brasil 500 anos, concedido pela União Brasileira de Escritores.
Tal obra divide-se em três partes: antes, durante e depois da chegada do grande capital à Amazônia. As três partes do livro, por sua vez, são divididas em dois núcleos narrativos, o núcleo da selva e o núcleo citadino. Em ambos os núcleos, personagens que vivem o dilema entre sua identidade ou tradição e o fenômeno de despersonalização imposto pelas novas relações de produção da vida decorrentes da “modernização” capitalista.
Somente após uma leitura superficial alguém poderia classificar essa obra como um “romance regional” que retrata uma saga amazônica. Na verdade, uma leitura cuidadosa mostrará – para surpresa do leitor – que se trata de um romance de caráter universal, que possui, como todos os grandes romances, a missão de recriar o mundo por meio de um sistema de ideias, pensamentos e imagens que unificam num só corpo a variação do cosmos, e que não vive apenas de minúcias de pequenos nadas individuais ou coletivos, mas de uma visão integral e macroscópica da realidade.
A Espera do Nunca Mais cumpre, portanto, com maestria, esse papel ordenador e recriador da realidade. Sua universalidade reside, sobretudo, no drama dos personagens, oprimidos versus opressores, a luta pela sobrevivência e por uma vida melhor com liberdade de escolha. Vítimas e algozes buscam seus ideais, sua identidade, o que não ocorre somente na Amazônia, mas em todos os lugares, razão por que classificar tal obra como “regionalista” seria reduzir sua grandeza.
Sena evoca Émile Zola em Germinal mostrando a luta entre classes, na qual os desfavorecidos se revoltam e são neutralizados. Zola, antes de escrever sua obra, efetuou larga pesquisa chegando ao ponto de conviver com mineiros. Sena, por sua vez, foi criado no ambiente descrito em suas obras – a Amazônia brasileira, mais precisamente, as selvas do município de Santarém, no estado do Pará –, e, para escrever este grande livro, procedeu também a uma profunda pesquisa. Tal esforço para pesquisar o meio e a cultura não é desprezível, pois Thomaz Edison disse que “o gênio é 1% de inspiração e 99% de suor”. O labor de Sena não produziu um livro de conteúdo apenas exótico, como tantos que escolheram as selvas amazônicas como palco para seus personagens. Maduras análises sociais expõem as chagas de uma sociedade que se debate entre o arcaico e o moderno:

“– Sabe o que eu penso, Julião? Tanto os militares quanto essa molecada que ataca o governo são umas mulas. Se a ditadura caísse, o Brasil acordaria no dia seguinte comunista. Já pensaste o horror? No Comunismo não há liberdade, nem propriedade privada, nem família. Tudo lá pertence ao Estado. E sabe quem é dono do Estado? Os burocratas – respondeu Cândido Abrósio, professoral.
– Oras bolas! Se é como diz o deputado, já estamos no comunismo! – provocou Julião.
– Como assim, meu jovem?!
– Me mostre a liberdade, a propriedade privada e a família no Brasil! Há liberdade com ditadura? Há, sim, más só para poucos. Liberdade para explorar uma mão-de-obra semi-escrava. Há propriedade? Há, sim, o latifúndio, enquanto a maioria não tem onde cair morta. Há família, deputado, com desemprego e salário de fome?” (p. 507/508)

A Espera do Nunca Mais, além de possuir caráter universal, também possui caráter épico. Para perceber estes caracteres o leitor deve fazer uma leitura observando três fatores fundamentais: o uso do “eu” Bakhitiniano, a complexidade psicológica das personagens e o uso do recurso narrativo in media res.
A primeira característica marcante que Sena trabalha em A Espera do Nunca Mais é o “eu” Bakhitiniano incompleto, dividido e que está numa eterna busca de ‘completude inconclusa’, em busca de si mesmo. O próprio título do livro apresenta esse “eu” Bakhitiniano – A Espera do Nunca Mais.

“Bem que eu gostaria de ir contigo, mas se nunca mais voltares também não vou chorar. Sabe, a gente aqui nasce e cresce esperando alguma coisa que a gente nem sabe o que é. A gente espera, espera, espera, tanto espera que acaba morrendo sem saber que passou a vida esperando” (p. 807).

Todos os personagens principais trazem em seu íntimo essa inquietação e angústia existencial.

Silvestre Bagata: “A partir de certo dia, porém, Silvestre Bagata começou a demonstrar um envelhecimento precoce. Perdeu o interesse pelo trabalho e até por Veva, e deu para acocorar-se no porto, no mesmo lugar onde se acocorava o vô Pachico, olhando sempre pro rio, balbuciando sons sem sentido enquanto coçava o enorme culhão que jazia fora do calção encardido, como se acometido por um pileque eterno. Sabá, assim como o pai outrora dava ao vô cuias de tiborna, dava-lhe agora de vez em quando goles de cachaça. Pouco a pouco um palor funéreo cobriu o rosto do valetudinário, que perdera a virilidade e o vigor, corroído por um processo de completo emasculamento, no qual os momentos de delíquio já eram mais longos que os de lucidez. Antes de morrer e ser enterrado na curva do rio, Silvestre Bagata aguentou algum tempo nessa semicoma...” (p. 57)

Gedeão: “Embora triste, Gedeão não desesperava, pois a esperança é como o ar para esses caboclos esquecidos há séculos no grande vale e que se acostumaram a viver uma longa espera.” ( p. 261)

Essa inquietação existencial é característica do ser eterno e interexistencial. Como cantou Raul Seixas: “Eu prefiro ser uma metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”. O ser humano não é apresentado como um ser uno, mas como um ser complexo que vive várias existências em busca de sua identidade. No início do romance é narrada a trajetória de Silvestre Bagata em várias existências até sua reencarnação como Gedeão. Esse ser traz consigo uma tendência depressiva suicida. Uma luta entre sua coragem e covardia.

“Cansado de investigar em vão a sua origem, Gedeão sentiu pela primeira vez aquele desejo de morrer tão típico dos Bagata.” (p. 180)

Em sintonia com a crença predominante entre os ‘povos da floresta’, Estefano Alves Barbosa, o vilão da obra, surge como a reencarnação do explorador português Bento Maciel Parente, que em 1639 comandou as chamadas Tropas de Resgates.

“... ele entregou ao facinoroso português Bento Maciel Parente, que comandava, em 1639, uma das piedosas ‘tropas de resgates’, que tinham como nobre objetivo libertar da escravidão e salvar da morte certa os infelizes índios aprisionados por outras tribos, subjugando-os porém a uma nova e mais atroz escravidão, pois, como diziam os senhores portugueses, ‘escravos por escravos, era preferível que o fossem dos cristãos’. Contudo, mal concluiu a vil transação, a Providência fulminou o tuxaua com a morte, na qual, readquirindo a plenitude do conhecimento, reconheceu o seu erro e aceitou o desafio de regressar a este mundo para submeter-se a novas provas, certo de que agora as venceria.” (p.58).

O caboclo Silvestre Bagata, já moribundo, como que num transe, olha para Estefano e lança o seguinte impropério, como se o conhecesse de longa data: “– Maciel, filho duma porca, assassino de índios, comedor de criança, eu sei quem tu és. Maciel, filho duma piranha, eu vou mas volto pra te f ...” (p.62)
Passemos à segunda característica marcante da obra, a construção das personagens. Analisando-as, observamos que o romance inova, pois estas são ao mesmo tempo planas (ou bidimensionais) e redondas (ou tridimensionais). As personagens planas geralmente são personagens caricatas, cujo nome representa suas características. Gedeão – aquele que luta pelo seu povo; Diana – a princesa, a bela; Silvestre – da selva; Julião – Julien Sorel de O Vermelho e Negro que vive entre a paixão e a ambição; Maria Clara – a típica burguesa, etc.
As personagens redondas têm profundidade psicológica, são dinâmicas, obedecem a impulsos interiores. Gedeão e Diana não são simples tapuios, têm sentimentos, nobreza e aspirações. Julião vive dividido entre o ideal socialista e a ambição na escalada social; este, como Julien Sorel de O Vermelho e Negro de Sthendal (que vivia dividido entre o amor de Madame de Rênal e Mathilde), vive dividido entre seu amor por Dora ou Maria Clara.

“Não fora pelo Partido que Julião decidira entrar no Exército, porque nenhuma entidade do mundo, nem mesmo o Partido, comandaria doravante seus passos. Não era mais uma peça que não encontra sentido fora da engrenagem. Fora manipulado por entes invisíveis, que ele próprio criara. Agora teria absoluto controle sobre seu destino. Chegara a retirar o pôster de Lênin da porta do guarda-roupa, pois não precisava de guias...” (p. 543)

“Quanto às mulheres, não fosse uma cabocla no Marajó e Maria Clara, Julião seria casto. Basta, porém, três meses de campus – convivendo com as garotas mais bonitas de Belém, filhas da aristocracia paraense – para adquirir consciência da atração que exerce sobre elas” (p. 595)

O vilão Estefano é também o típico conquistador, possui uma vida dupla, vivendo os costumes dos selvagens e mantendo uma família típica burguesa na cidade.

“... Mas como sou um homem bom, faço-te a seguinte proposta: se mandares a tua mulher dormir comigo amanhã à noite no barracão, perdôo todas as suas dívidas.” (p. 127).

“O comerciante Estefano nunca se conformara por não ter um filho varão, legítimo, para ajudá-lo nos negócios. Amava Dora – ao seu jeito, é verdade –, mas não era a mesma coisa. Ele precisava tanto de um filho homem! Mas, à falta deste, daria à filha tudo o que também daria ao filho que não veio, inclusive estudos. Por isso a moça teve de vir a contragosto para Belém, onde começou a estudar administração de empresas – mais uma imposição paterna” ( p.289)

Diana, por exemplo, que poderia ser uma simples cabocla, define seu entendimento sobre a interexistência do ser:

“– Ninguém morre, apenas desaparece, mas fica na lembrança da gente e nas coisas que a gente vê mas não sabe que é a pessoa que foi simbora; e quando essas coisas olham para a gente então a gente lembra da pessoa que se foi; a gente lembra e pensa que é só lembrança, mas não é não; a pessoa que foi simbora tá aí pertinho da gente e a gente não vê...” (p. 808)

Por fim, a terceira característica fundamental da obra: A forma de narrativa. Sena utiliza o in media res (latim para “no meio das coisas”) que é uma técnica literária onde a narrativa começa no meio da história, em vez de no início (ab ovo ou ab initio). Os personagens, cenários e conflitos são frequentemente introduzidos através de uma série de flashbacks ou através de personagens que discorrem entre si sobre eventos passados. Obras clássicas tais como a Eneida de Virgílio e a Ilíada de Homero começam no meio da história. Apesar da ordem dos acontecimentos não ser linear, a História não perde verossimilhança nem credibilidade, uma vez que em seu romance-epopéia Sena descreve com intenção de veracidade os acontecimentos históricos (a construção da barragem no rio Maró – a luta pela liberdade dos caboclos da região – a luta pela escalada social de Estefano e Julião). Com este processo, a ação torna-se mais dinâmica e mais atraente para o público e constitui a terceira característica fundamental da obra.
No capítulo 1 da primeira parte a narrativa começa com Gedeão durante o meio da saga:

“Era ainda muito cedo quando o grasnar desagradável das ciganas o acordou. Gedeão saltou da rede onde dormira e, às apalpadelas, tropeçando em alguns paneiros de farinha empilhados no piso de chão-batido da casa, procurou a tênue claridade que penetrava pela porta de palha.” (p. 19)

Em seguida, no capítulo 2, a narrativa faz um flashback voltando a Silvestre Bagata, vida anterior de Gedeão:

“Conta-se que Sebastião Bagata, o Sabá, era o mais velho dos cinco filhos do falecido Silvestre Bagata, cujo avô, ao que se sabe, foi o primeiro morador do rio Maró...” (p. 30)

Então a narrativa segue até chegar ao momento do 1º capítulo e, então, inicia-se a segunda parte do livro.
Na segunda parte do livro é narrada a trajetória do personagem Julião, do núcleo citadino. No primeiro capítulo da segunda parte Dora, filha de Estefano, conhece Julião, aquele que viria a ser seu esposo:

“– Não és o rapaz que conversou comigo no primeiro dia de aula, o filho do fazendeiro do Marajó?” (p.292)

No 11º capítulo da segunda parte – O Búfalo Rosilho – ocorre um novo flashback para o momento em que o jovem Julião chega a Belem para estudar ficando hospedado na casa do Sr. Alarico, um fazendeiro amigo de seu pai:

“E Julião foi logo cair na casa dos Alarico. Uma gente metida a besta, que morava num prédio modernoso, enfeitado com pastilhas coloridas, para distinguir-se dos velhos casarões empoeirados onde ainda se escondiam os netos decrépitos da aristocracia decadente dos tempos da borracha” (p. 363)

Então a narrativa segue seu curso, adentrando a terceira parte do livro e seguindo até o final da obra. O uso do recurso narrativo in media res aliado à complexidade das personagens e dramas típicos do povo amazônico constitui o caráter épico do romance-epopeia A Espera do Nunca Mais. A antiga epopeia girava em torno de um acontecimento amplo e invulgar no qual um povo via espelhado o melhor de seu caráter moral e material. Quem atuava eram homens de superior envergadura, protótipos da comunidade, heróis ou semideuses que cumpriam a vontade divina.
Em A Espera do Nunca Mais o homem comum perde a força heroica e ganha em autonomia afetiva. O Mito aparece e cede o seu lugar ao social. Tal romance épico surge como um tipo superior de romance que remete o leitor ao mito moderno. Canta-se ao leitor as lutas e feitos do povo amazônico diante do aparecimento do Capital com suas quase sempre maléficas consequências.
A Espera do Nunca Mais é uma verdadeira lusíada da Amazônia (ou melhor, amazoníada) com toda sua grandeza épica e romanesca, obra digna de ser lida, estudada e para figurar no cânone da literatura brasileira.

_________________
*Rodrigo Felix da Cruz é bacharel em Letras e Licenciado em Letras Português-Francês pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP-Universidade de São Paulo. E-mail: rodrigofelixcruz@ig.com.br

domingo, 25 de outubro de 2009

Banana - Poema, Silas Correa Leite a Poster-Poema Basho




Bananeira


A bananeira carregada, cheia de si
De pose
Aponta o carnoso coração vermelho
Depois os dentes-teclas donde surgem
As pencas que trazem da cor do sol
Sob as folhas verdejantes, as bananas

A bananeira era como uma bandeira
No quintal
Carregando toda uma simbologia
Você apreciava os frutos pintadinhos
E ficava a metáfora de tamanho viço
A própria bananeira imperiosa árvore

As bananeiras todas de minha triste
Infância
Ainda andam comigo entre os poemas
O coração viajoso e as tantas pencas
Das poesias dando banana para a vida
Que só fez muita marmelada comigo
-0-

Silas Correa Leite
E-mail: poesilas@terra.com.br

sábado, 24 de outubro de 2009

Livro Licânia de Clauder Arcanjo, Resenha de Silas Correa Leite

Silas Correa Leite, o Resenhista, na TV Cultura


Crítica:



Livro Licânia, Contações Bonitas do Escritor Clauder Arcanjo


“As batalhas nunca se ganham.
Nem sequer são travadas. O campo
de batalhas só revela ao homem a
sua própria loucura e desespero,
e a vitória não é mais do que uma
ilusão de filósofos e loucos...”


William Faukner, O Som e a Fúria






A obra Literaria “Licânia” de Clauder Arcanjo por si só já se apresenta esteticamente bonita, principalmente enquanto projeto técnico-editorial também. E você, logo de cara, fica curioso a pensar de curtir para o mais breve momento possível o poder possuir o livro, adentrá-lo a partir da própria bela sedução do projeto da Capa (Tobias Queiroz//João Helder Alves Arcanjo).

Depois você para a correria da loucura que é a labiríntica Sampa de tantos contrastes sociais e impunidade generalizada, se aquieta como pode na medida do possível, se acomoda entre um blues e um copo de cerveja, e entra de cara na obra, vivenciando a expectativa de um estar-Crusoé em lugar novo, cidade do interior, procurando o entretenimento do remanso possível na arte. E pesca o primeiro conto “A Casa”.

Alias, você entra literalmente nela pela mão do autor também cativante pelo modo que cria seus contos, contos-crônicas, narrativas cativantes, bonitas. Você “vê” o tipo nas palavras, como elas se apontam e conduzem você serenamente. O veio da narração entorpece, leva, consolida a imagem da contação. Lindo enlevo. Qualidade ficcional.

Rua: casebres e mansões. Panos do tempo. Carcaças entrecortadas feito memoriais de percurso e releituras de vida com suas tantas significâncias de amor e dor. Arquivos e seus musgos. O colégio. A música. A vida com suas perdições e harmonias, levada na flauta. A sonata, o boné.

Contações gostosamente perfeitas. Clauder Arcanjo e a dor-partituras das suas histórias. Personagens maviosamente humanos resgatados, pinçados, pintados assim no palavrear aqui e ali costurando um lado meio zen-bucólico.

Identidade: a bruta dor. O Conto-ideia Cemitério, então, terno, paradoxalmente assustador pela loucura-leveza que prediz da criação-condução de. Daria um belo romance bem interessante, se o autor o aumentasse e fizesse tomar vulto para tanto, na engenharia das palavras para as quais tem belo acervo de recursos.

Pensei aqui e ali no Incidente em Antares, de Érico Veríssimo, mas o conto se virasse obra maior e encorpada, teria ainda mais beleza poética, com trejeitos da cidade que loca Cem Anos de Solidão de Gabriel Garcia Marques, algo mágico, o encantamento depois da morte, da fatalidade, uma cidade-nuvem, assim, alumbramento-lugar. Ainda um conto e tanto, o melhor do livro.

“As historias não são nossas(...) São daquele que fez o caminho no caminhar” (In, pg 52, Pó do Chinelo). A vida tem as tintas, tem os remorsos, mos e pós do tempo que nos enlivra nas acontecências também. Lindo conto O Sineiro. Tocante, quase mágico-poético. O conto O Riso do Cão tem um “de-que” de causo, bem delineado, feito histórias que o povo conta.

Os contos te tocam com leveza, acenam, despacham-se e lá se vão, leitura a fora, revelações a dentro, mais a imaginação do leitor que também pesa ao assumir de per-si o que lê e alumbra em sua mente envolvida.

E me fizeram evocar o retratista de meu tempo de criança, la na minha aldeia-mãe de criação, na linha do tempo pitoresca, o lambe-lambe capturando as entranhas da alma das coisas, das pessoas e paisagens, de sombras e penumbras delas, da cidade entregue ao deus-dará, de seus pretos e brancos, pretos e prantos, escombros e ramificações humanizadas de.

Clauder Arcanjo é um retratista das palavras. Coloca em sépia alguns momentos, figurando-os, com ternura e leveza. Mas sempre mantém o norte da mão em seu caudal criativo, somando fatos imaginário, suas construções arejadas, arquitetura de palavreiros, feito assim ainda um recolhedor de pertencimentos de seu tempo, sua época, com seu olhar ora irônico, ora cheio de humor, mas num delineamento que enserena verbos, tópicos e finais. A baunilha dos parágrafos.

Traz a singeleza da vida pro livro, para o seu tão peculiar contar. Descreve cores e cenas com fruição embonitada da própria riqueza do olhar extremamente sensível. Um retratista de qualidade pescando no remanso do cotiadiano dia-a-dia de uma pacata cidade do interior, que se alimenta de seres e de suas sensações e movimentos. Licânia. Contos, ou todos eles aparelhados formando um romance?

Clauder Arcanjo encorpou um livro bonito, que se apresenta bem e encrespa a cabeça do leitor com gosto de, ao final, querer mais e o que era bom acabou-se, quem leu arregalou-se, como dizia o Palhaço Buscapé de meu circo de antigamente.

O escritor provendo sua situação de estar no mundo. Julio Emilio Braz (Histórias Maravilhosas de Povos Felizes) diz que as histórias que contamos nos dão a eternidade...

Clauder Arcanjo desenha momentos resgatados de vidas no que muito bem retrata literariamente. E se faz parte do acervo literal pelas suas próprias mãos e com a sua bela paleta arquitetural de contações em alto estilo.


-0-

Silas Correa Leite
Santa Itararé das Letras, São Paulo
E-mail:
poesilas@terra.com.br
Teórico da Educação, Jornalista Comunitário, Conselheiro em Direitos Humanos
Pós-graduado em Literatura e Arte na Comunicação (USP)
Autor de O Homem Que Virou Cerveja, Prêmio Valdeck Almeida de Jesus, Salvador, Bahia, 2009, Giz Editorial, SP
Blogue:
www.portas-lapsos.zip.net

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Os Poemas Assustadores de Marcelo Ariel








Pequena Resenha Crítica


CHORUMES: Os Poemas “Anjos Afogados” de Marcelo Ariel


“Os seres humanos me assombram”

Markus Zusak

In, A Menina Que Roubava Livros




...................................................................................................................................................

Espantalhos: seres reses. A máquina de existir é a máquina de parir seres. Serão seres? Existem? “Existir a que será que se destina?”, perguntou cantando Caetano Veloso. O Poeta de Cubatão, Marcelo Ariel, sabe. Deve doer saber. E nos responde por tabelas ou diretamente nas fuças com horror de ver, viver e escreviver: anjos afogados. Anjos em fios de alta tensão. A morte-amor. Choro e ranger de dentros. Jean-Paul Sartre dizia que ninguém é escritor por haver decidido dizer certas coisas, mas por haver decidido dizê-las de determinado modo.

A chocante Poesia de Marcelo Ariel é uma fronteira cercada de destroços por todos os lados. Vidas-Socós. As duras realidades focadas na névoa-nada. A vida sobrevivencial lançando chamas na UTI do cáustico olhar plausível. A alma sangra entre o chão-diesel e os estilhaços poéticos multicortados de pontos de interrogachão. A cena do crime de existir. Escrever é um modo de estar no mundo, para repugnar-se contra o próprio mundo, e ainda assim sentenciá-lo ao assento de horror.

A poesia tirando enterros da alma em pedaços. O revólver quente da criação destrinchando verbos, versos, ver-se, ter-se, verter. Prismas-caças-e-caçadores. Poesia dolor. “Como o céu que dança pra si mesmo/Sem a nossa presença/E depois apaga” (In, Com Miles Davis na Serra, pg.48). Os desterros são íntimos. Os aterros sociais têm seus chorumes dolorosamente lírico-contestatórios por assim dizer. Feito um açougue metafísico de almas letrais.

Marcelo Ariel voa com remos. As desnaturezas do ranço humano/urbano/insano. A maldição daquele que respiga as sobras, restos de nadas: sub-seres. E ainda achando poemas aí. Meio Jean Genet Pretobrazyl, um pleno pliniomarcos mestiço nas trincheiras do caos que retrata em fotogramas de amarguras, pintando com lucidez palavral os seus achados e perdidos. Não é fácil. Nunca foi.

Um Goya-rimbaud. Os sem cérebro produzem monstros. Como ainda tirar poemas do inferno?. O lusco-fusco não sabe de lágrimas de muito além de Dante. O inferno são os seres. O céu rebrilhante de Cubatão é poluição pesada. A poesia toxina esplende um historial da morte poeticamente homeopática dos que foram soterrados. Em meio ao monturo Marcelo Ariel vaza poemas-lágrimas, poemas duros, tristes, contundentes, assustadoras lascas de seu meio. Filósofo e metafísico. Que ciência há em não pensar sobre? Entre carcaças de todos os tipos e naipes, os poemas-letra-de-rock pesado em valas perdidas. Chorumes-rajadas. Metralhando palavras que se encorpam em peso-visão, brutezas pegajentas. Falou o diabo e aparece o anti-clímax. A vida só é possível reinventada, disse Cecilia Meireles.

Poemas sentidos. Há sangue pra tudo. Serão só poemas? Testemunhos-depojos. Não, são também luzes negras sobre macadames de lixões. “A morte não dorme/A alma não pensa/A vida não vive” (In, Veredito, pg 93). Marcelo Ariel é isso: esquisito porque puramente real por mais que isso nos doa. O asco é mais embaixo. Só os imbecis são felizes. Não há sensações no esquecimento. Ai de ti Cubatão-Brazyl! Ensaios de amargedons localizados, datados. Estúdios a céu aberto entre viadutos, chaminés, mangues e resíduos fichados. Entre ratos, abutres, quasehumanos. A sifilização-réstia. O olhar transido é ainda recolhedor sistêmico. Ponches de restos. Sangria desatando subvidas. Os excluídos sociais, os carentes, os sacrificados, as amarguras de. Tudo do mesmo. Paradoxos inexatos que sucumbem entre mesmices impunes. O teatro de absurdos da vida real no seu pior estertor. “Na noite/Se convertendo em transparência sem tempo” (In, Espelho, pg.137). Marcelo Ariel não é fácil também. Somos literalmente atravessados por seus versos de arames em tintas entrecortadas dele mesmo no seu estilo todo próprio de repaginar o que vê/sente/comporta/assoma/redime... liquidifica. Assustador.

Marcelo Ariel é um soco de luz no LER. Ler o livro de Poemas “Tratado de Anjos Afogados” é um sopro na acomodação saturada. Poesia puro sangue. Os perdidos nas estrofes sujas da mais descarnada vida são literalmente revivificados. Escrevendo ele tira fantasmas da névoa e diz da dor de havê-los. Dói sentir a dor dos outros. Não há como sarar o mundo; já não é possível curar o mundo. Parafraseando Baudelaire, sob o crânio da raça humana o horror não faz milagres. Os miseráveis precisam de poetas para retratá-los, serem assim disformes registrados em suas condições de subvida, como seres ocasionalmente sobrevivenciais que acabam sendo, entre os chorumes dos condomínios fechados e os tantos insensíveis podres poderes. As cinzas das desonras.

Falando sério, cara pálida, é muito difícil resenhar um livro como o Tratado dos Anjos Afogados de Marcelo Ariel. Você procura palavras exatas e não acha, não cabem, querem refugar o sentir, o pensar, o se achar num igual. Não há metáforas que caibam como identificações em poemas de tal grandeza cívica até. Nem são almas penduradas nos varais para secarem os ossos, mesmo que pareçam. Com tanta “informação” (poesia tensão) você fica irado com a carga poética que recebe, apreende, engole a seco; feito um ocasional renunciante à vida. Vida? Como não fazer parte daquilo e se aceitar humano? Que vida? O que é isso? Seres? Que seres? Chorumes.

Poemas como incompreendidas nênias entoando impressões digitais de mortos. A carne-vida nos poemas insepultos. Dentro das covas clandestinas desses céus e infernos não há GPS. Que cadáver-vitrine é a raça humana, a civilização por si mesma? Marcelo Ariel arranca poemas de feridas. Leia-o. Isso é que é Poesia. Venha para o mundo de Marcelo Ariel. Mas se apronte que vai doer um bocado. No entanto, você também precisa se enxergar no charco, ver a própria lama social entre cacos de espelhos.

Subterrâneos de confins. Marcelo Ariel escreve poemas como quem recupera, com sua placa mãe de captura em alta sensibilidade, os suspiros dos sentenciados a sobreviver; como ainda um pior castigo-condenação do que ter que existir.

Existir?

-0-

Silas Correa Leite – E-mail:
poesilas@terra.com.br
Blogue: www.campodetrigocomcorvos.zip.net
Autor de O HOMEM QUE VIROU CERVEJA, Giz Editorial, 2009, SP, Prêmio Valdeck Almeida de Jesus



BOX:

Livro: TRATADO DOS ANJOS AFOGADOS – Gênero Poesia
Autor: Marcelo Ariel – Literatura Brasileira Contemporânea
marceloahriel@yahoo.com.br – Coleção Sentimento do Mundo
Edição 2008, 216 páginas


Editora: LetraSelvagem – Associação Cultural LetraSelvagem
Organização Nicodemos Sena
E-mail:
letraselvagem@uol.com.br
Site: www.letraselvagem.com.br

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

O Céu, Um Paraiso de Livros?



Artigo/Opinião:

O Céu: Um Paraíso de Todos os Livros


“Mais eis que a palavra
Cantoflorvivência
Re-nascendo perpétua
Obriga o fluxo

Cavalga o fluxo num milagre
De vida...”

Orides Fontela


...O Céu deve ser na verdade uma biblioteca... e-n-o-r-m-e – onde repousam todos os personagens, anjos, heróis, narradores implícitos e explícitos, tipos de capa e espada (e de asa nos pés, antenas ligadíssimas e luz nos olhos), esperando não Godot, Ben-Hur, Lewis Carroll, que já estão assentados por lá, mas Um VISITADOR. Esperando serem visitados (na imaginação? no sonho?) pelos benditos Escritores de Livros! Deus, claro, é o supremo Maior Bibliotecário-Comandante-em-Chefe do Universo. E ali também edita suas (nossas) Vidas-Livros, que sonham finais felizes no palco iluminado da Nave Terra-mãe, sob chão de estrelas. Já pensou que demais, diria o Snoopy?

...O Céu, como uma literária e infinita barriga gestora, guarda, assim, todos os livros que foram escritos; os livraços que serão escritos; os imemoráveis e inimagináveis que ainda estão sendo escritos, entre sonhos, sofrências, blues etílicos, alumbramentos e lágrimas, entre pontos de interrogações, tópicos frasais, nexos causais e reticências em braile... Um e outro santo escriba abençoa uma orelha de livro, um arquivista maroteiro com olhos de lince tira os pós das mesmices entre a água e o açúcar do proseio celeste, e Mestre José Carpinteiro ilustra – na mente dos criadores – capas, prefácios, releituras e citações. Um anjo de asas de papel-arroz amanteigado (com reflexos da Via Láctea), com todas as letras de todos os alfabetos do mundo visível e invisível, no sensorial do escritor a cismar alhures, poetas, romancistas, Sentidores (para citar Clarice Lispector), delicadamente com voz de palha em sonata íntimo-espiritual “sopra” o bendito nome da obra-prima, com subtítulo, modus operandi e tudo. Já imaginou?

...O Céu de todas as Honras e Glórias inimagináveis, claro, tem um arquivo cósmico de todos os historiais. Do gênese supragalaxial, ao salmo cor de rubi, passando pelos mantras-banzos-blues-fados dos apocalipes de mil idéias com signos ficantes. Robinson Crusoé é agora uma abençoada janela-arquivo de lá, num cantinho com pintura xadrez que dá, nos horizontes e crepúsculos, para um ninhal escarlate de suntuosidades binárias, feito rancho de meteoros-metáforas esplendentes.

...O Céu também pode ser só um pouquinho aqui, amostra grátis no DNA metafísico de cada criador e criação. O Escritor que gera livros-árvores, livros-nuvens, livros-circos, livros e pertencimentos enlivrados. Como Hilda Hist, Olga Savary, Clarice Lispector, Proust, Tolstói, Neruda, Saramago, Brecht, Rilke, Cortázar. O escritor ins-pirado, ensimesmado, tocando por uma fagulha de amparo infinital, imagina, desmancha a seco, arrruma, cria, pesquisa e, eureka!. Surgem pedacinhos do céu como Cem Anos de Solidão, O Vermelho e o Negro, Incidentes em Antares, Grandes Sertões Veredas, Sentimentos do Mundo, O Nome da Rosa. A alma de cada um, recolhedor na curva do tempo, no imaginário ou da bateia de memórias, escrevendo uma vida-livro, um clássico. Só por Deus. Fico só sondando o devir, depoimento, rascunho, testemunho letral de um tempo, um povo, um local, uma mente brilhante atiçando implicações que cativarão olhares maviosos.

-No Céu não existe pecado e nem sanção de percurso-viagem-visita (todos serão perdoados?), nós todos, em capa dura ou com colagens de trilhas, temos a nossa vida inteirinha para escrever essa existencialização, tentarmos por uma bela vida e bela obra, com um final feliz. Bem-aventurado aquele que acerta na primeira edição sem cortes. Pois será Céu e na Terra um livro aberto de Deus, Livreiro-mor. No mais, vidas-livros são auferidas, recompostas, registradas, acrescentadas de aforismos, citações célebres, tragédias ou mesmo ilustrações maravilhosas. Que Paraíso de Livros é o Céu, cheios de zilhões de escrivaninhas, estantes, caixas de pandora com suas páginas atemporais...
-No Céu, existir mesmo é conjugar o verbo Escre/Viver; existir é ler (oxigênio matrix), pois não existe Morte ao ler; no ler, por ler. Dormimos o sonho da viagem para dentro de nós, uma vida, um causo, uma croniqueta, uma historiazinha pro Menino Jesus dormir seu sonho de trombetas. Ler é uma busca para a nossa Cura. Cada livro um historial, uma sentição, um rocambole geral a revelar-se em páginas de lágrimas e luzes se misturando, o vermelho e o negro, o azul e o amarelo, a loucura e a lucidez, sob o percurso de um altíssimo balão encantado segurando pontos de interrogações com baunilha num céu de chocolate...
...No Céu, pássaros-marcadores de livros, árvores-papéis de pão, borboletas-vaga-lumes-ideias, pirilampos de tons e nuances, rinocerontes de enlevos, rios de inspirações, nuvens e chuvas de vírgulas, relâmpagos de pensamentos-chaves, tudo o que depois serão versos, estrofes, parágrafos, apresentações, músicas pra alma procurando calma pra se coçar... Cada um lê-se a si mesmo, acrescenta o que se lhe vem a cabeça (consultem sempre o coração), invade pontuações, pondo pingos nos is ou, de relance, quem o sabe um dia, com tantas placas mães e placas de captura, no futural, colocando até pingos em dáblios... Nada é impossível ao que lê.
-Ah “Terra do Era Uma Vez”, o Céu pode ser dentro de cada um de nós aqui. Shangri-lá, Jerusalém, Pasárgada, Santa Itararé das Letras, São Petesburgo, São Paulo, Curitiba, Brasília. A cidade-livro. O herói sempre vence no final, pois a esperança é a inteligência da vida. Vivendo e aprendendo a escrever-se. Lendo e se refazendo, cortando exageros, pois o espírito não tem peça de reposição e nem inventaram bisturi ou silicone para a alma. A re-existencialização-pagina-aberta de cada um ser ou não Ser; cada clã, núcleo de abandono, ilha, adubo, enciclopédia, dicionário, clássico, coleção, gibi, quadrinho, palavra cruzada, cartun, jornais, revistas, livros... almanaques...
...Corra e olhe o céu, diz a balada de Cartola. Traga um céu para si e em si, em todos os recomeços vibracionais. Um Livro, pedaço de seu rio interior. Faça de sua vida-livro um belo romance com realizações e incompletudes que sejam. Sempre fica uma dúvida no ar mesmo, com o que queremos dizer ou soa no diferencial do implícito. Você sempre volta ao local de seu livro de existir. Você é o seu próprio capital de peso. Você é em si mesmo a própria impressão digital, a melhor e a pior prova testemunhal presencial contra e a favor do que você se escrever existindo. Já pensou que risco?. Capriche na narrativa-documento. O leitor-vida-livro sempre vence no final. Na casa do pai já muitas coleções. Escolha o seu cantinho, o seu estilo, a sua ilha-edição. Uma visão ético-plural comunitária ajuda muito nessas horas. Sarar o mundo. Sentir a dor do outro. Corações e mentes enlivrados, já pensou? A sua cara e a sua coragem colorida. Vidas capítulos. Acertos de contas na hora de passar-se a limpo. Refinamentos. Perdendo lastros. Ser feliz é a melhor resposta, a melhor vingança, a melhor solução. EscreViver, evoluir, correr atrás dos sonhos com as mãos limpas e uma lupa magna procurando erros atrás das ilusões perdidas, como se tudo fosse só uma ilha da fantasia em que você de si mesmo e para todos que o rodeiam escreve o roteiro... Silêncio, gravando!
...Seja feliz enquanto escreve nas luzes da ribalta. Seja você seu próprio acervo. Eu fui muito feliz. Eu tinha um pai que contava historias de Itararé e do mundo pra mim. Quer maior riqueza do que isso? Vivendo e aprendendo a viver. Lendo e aprendendo a ser. Cada um de si próprio o capítulo que precede o clímax. Será o impossível? Muitos são chamados e poucos escrevem certos por linhas tortas. Há um céu. Na dúvida, largue tudo e vá ler um livro. Está estressado? Leia um livro de poemas. Está azedo? Leia um romance com capricho e conteúdo denso. Fique encucado, pense e reflita. Pode ser que ainda esteja em tempo, e você desperte a chance de pegar a chave da imaginação e então poder registrar-se numa ala da Biblioteca do Céu, estar como um verbete na enciclopédia artística de Deus, o seu nome-vida-livro nos pilares sagraciais de todas as sagas. O seu nome arrolado lá, no historial perene do livro da vida, pois o que você se escreve na terra, Deus escreve no Céu. No Céu de todas as vivências-históricas, O Paraíso dos LIVROS!.
-0-
Silas Correa Leite, Santa Itararé das Artes, São Paulo, Brasil
Primavera de Livros, 2009 – E-mail:
poesilas@terra.com.br
Autor de Porta-Lapsos, Poemas, e Campo de Trigo Com Corvos, Contos, a venda no site
http://www.livrariacultura.com.br/
Prêmio Lygia Fagundes Telles Para Professor Escritor