sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Tio João Maria de Oliveira, Uma Saudade Imensa




Um Tio na Parede da Memória: João Maria de Oliveira


Eu devia ter uns dois, três, talvez quatro anos. Começo de 1950. O Tio João Maria me pegava no colo, me jogava para ao alto, eu ria muito. Eu me lembro... eu me lembro... o pai no acordeão, o Tio João Maria na flor da juventude no violão, e eu num improvisado pandeiro feito com lata redonda de marmelada. Era a Cidade Nova. Era Harmonia, Era Monte Alegre, hoje Telêmaco Borba, no Paraná. Cresci, outros irmãos nasceram, voltamos para Itararé. Um dia, o querido Tio João Maria que morava conosco, simplesmente anoiteceu e não amanheceu. Nunca mais o vimos. O que foi? O que não foi? Nunca soubemos. O Tio João Maria garrou o mundão sem porteira de Deus. Ficou na parede da memória, o jeitão dele, o sorriso graúdo dele. E a foto em preto e branco na parede. Como um sinal do tempo. Crescemos, sempre com o Tio João Maria sendo lembrado, um herói, um grande tio daqueles que toda familia tem. Passaram-se os anos. Cresci. Um bendito dia ouvi dizer que ele estava pros lados da Bolívia, depois Campo Grande, Mato Grosso. Fiz contatos. Uma rádio local divulgou. Eu já formado, chefe de escritório, certa feita recebo pela rádio, um telefonema. Ao vivo.: O Tio João Maria estava no ar. Falou comigo. Emoções recompostas. Troca de cartas. A familia sempre lembrando o jeito alegre, serviçal. Perdemos contato novamente. A luta dura da vida. Depois o soubemos viúvo. Depois o soubemos doente. Nunca mais voltou para Itararé. Nunca mais voltou pra nós. Mas, também, de dentro do coração, nunca mais saiu. Nesses tempos modernos, recuperamos fotos, escaneamos, via orkut fiquei sabendo de um filho querido dele, o Primo Jorge. Tudo de novo. Falamos com o Tio João Maria. A Familia alvoroçada. Minha mãe, doente, bem mais velha, sonhando com a volta dele, a fronha de lágrimas. O reencontro depois de mais de meio século. O tio distante, Itararé tão longe, João Maria falou comigo por telefone. Trocamos figurinhas de saudades. Recuperamos outras fotos. Temos o número dele. Ligamos. Conversas amarradas naquela imagem do tio jovial, que hoje fez redondos oitenta anos, a caminho do centenário. Como um personagem do mundo encantado, como um ser mítico, o Tio João Maria personificava o sonho, o herói, o aventureiro, o distante, o vencedor. Depois o soubemos leonino como eu, um poeta louco e sonhador. Conversamos com o tio. Promessas de ir visitá-lo, tão longe. Ainda devo realizar este sonho. Emoções. Imagine abraçar um tio que, como uma estrela, um raio de sol, conviveu em nossas doces memórias e, depois de cinquenta anos – eu era um guri de tudo quando ele foi embora – poder abraçá-lo, colocar 50 anos num só abraço?. Será que o meu coração vai agüentar? Será que o coração dele ainda está forte?. Um dia nos reencontraremos, certamente. Cedo ou tarde, as almas que se amam se encontram nesse mundão de Deus. Até lá, o Tio João Maria recebe meus livros, poemas e contos, minhas fotos, e, certamente também, talvez, pense como poderia ter sido diferente. Mas não é, não foi. O Tio João Maria é parte de nós, de nossas almas, de nossas memórias, de nossos corações. Escrevo. O coração arrebentando no peito. A saudade é um porto, a lembrança um barco, escrever é singrar horizontes. Pois é, Tio João Maria, também sou de agosto como o sr, também saí de casa, também sumo do mundo quando escrevo, enfrentei barreiras. Para um poeta sonhador, longe é um lugar que não existe. O estamos esperando. Sempre estaremos. Numa lembrança, numa lágrima, num sonho. O sr me pegava no colo, me jogava pra cima, eu ria muito. Ainda estou nalgum lugar lá em cima, Tio, parado no ar, esperando, tendo sua lembrança como uma bandeira, um farol, um mimo de afeto. Talvez, quem sabe um dia, o poeta abraçará o seu mais adorado Tio João Maria de Oliveira. Um rio de Lágrimas há de romper em Campo Grande para unir corações que nunca se separaram.


Silas Correa Leite, Agosto de 2009.

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