domingo, 25 de outubro de 2009

Banana - Poema, Silas Correa Leite a Poster-Poema Basho




Bananeira


A bananeira carregada, cheia de si
De pose
Aponta o carnoso coração vermelho
Depois os dentes-teclas donde surgem
As pencas que trazem da cor do sol
Sob as folhas verdejantes, as bananas

A bananeira era como uma bandeira
No quintal
Carregando toda uma simbologia
Você apreciava os frutos pintadinhos
E ficava a metáfora de tamanho viço
A própria bananeira imperiosa árvore

As bananeiras todas de minha triste
Infância
Ainda andam comigo entre os poemas
O coração viajoso e as tantas pencas
Das poesias dando banana para a vida
Que só fez muita marmelada comigo
-0-

Silas Correa Leite
E-mail: poesilas@terra.com.br

sábado, 24 de outubro de 2009

Livro Licânia de Clauder Arcanjo, Resenha de Silas Correa Leite

Silas Correa Leite, o Resenhista, na TV Cultura


Crítica:



Livro Licânia, Contações Bonitas do Escritor Clauder Arcanjo


“As batalhas nunca se ganham.
Nem sequer são travadas. O campo
de batalhas só revela ao homem a
sua própria loucura e desespero,
e a vitória não é mais do que uma
ilusão de filósofos e loucos...”


William Faukner, O Som e a Fúria






A obra Literaria “Licânia” de Clauder Arcanjo por si só já se apresenta esteticamente bonita, principalmente enquanto projeto técnico-editorial também. E você, logo de cara, fica curioso a pensar de curtir para o mais breve momento possível o poder possuir o livro, adentrá-lo a partir da própria bela sedução do projeto da Capa (Tobias Queiroz//João Helder Alves Arcanjo).

Depois você para a correria da loucura que é a labiríntica Sampa de tantos contrastes sociais e impunidade generalizada, se aquieta como pode na medida do possível, se acomoda entre um blues e um copo de cerveja, e entra de cara na obra, vivenciando a expectativa de um estar-Crusoé em lugar novo, cidade do interior, procurando o entretenimento do remanso possível na arte. E pesca o primeiro conto “A Casa”.

Alias, você entra literalmente nela pela mão do autor também cativante pelo modo que cria seus contos, contos-crônicas, narrativas cativantes, bonitas. Você “vê” o tipo nas palavras, como elas se apontam e conduzem você serenamente. O veio da narração entorpece, leva, consolida a imagem da contação. Lindo enlevo. Qualidade ficcional.

Rua: casebres e mansões. Panos do tempo. Carcaças entrecortadas feito memoriais de percurso e releituras de vida com suas tantas significâncias de amor e dor. Arquivos e seus musgos. O colégio. A música. A vida com suas perdições e harmonias, levada na flauta. A sonata, o boné.

Contações gostosamente perfeitas. Clauder Arcanjo e a dor-partituras das suas histórias. Personagens maviosamente humanos resgatados, pinçados, pintados assim no palavrear aqui e ali costurando um lado meio zen-bucólico.

Identidade: a bruta dor. O Conto-ideia Cemitério, então, terno, paradoxalmente assustador pela loucura-leveza que prediz da criação-condução de. Daria um belo romance bem interessante, se o autor o aumentasse e fizesse tomar vulto para tanto, na engenharia das palavras para as quais tem belo acervo de recursos.

Pensei aqui e ali no Incidente em Antares, de Érico Veríssimo, mas o conto se virasse obra maior e encorpada, teria ainda mais beleza poética, com trejeitos da cidade que loca Cem Anos de Solidão de Gabriel Garcia Marques, algo mágico, o encantamento depois da morte, da fatalidade, uma cidade-nuvem, assim, alumbramento-lugar. Ainda um conto e tanto, o melhor do livro.

“As historias não são nossas(...) São daquele que fez o caminho no caminhar” (In, pg 52, Pó do Chinelo). A vida tem as tintas, tem os remorsos, mos e pós do tempo que nos enlivra nas acontecências também. Lindo conto O Sineiro. Tocante, quase mágico-poético. O conto O Riso do Cão tem um “de-que” de causo, bem delineado, feito histórias que o povo conta.

Os contos te tocam com leveza, acenam, despacham-se e lá se vão, leitura a fora, revelações a dentro, mais a imaginação do leitor que também pesa ao assumir de per-si o que lê e alumbra em sua mente envolvida.

E me fizeram evocar o retratista de meu tempo de criança, la na minha aldeia-mãe de criação, na linha do tempo pitoresca, o lambe-lambe capturando as entranhas da alma das coisas, das pessoas e paisagens, de sombras e penumbras delas, da cidade entregue ao deus-dará, de seus pretos e brancos, pretos e prantos, escombros e ramificações humanizadas de.

Clauder Arcanjo é um retratista das palavras. Coloca em sépia alguns momentos, figurando-os, com ternura e leveza. Mas sempre mantém o norte da mão em seu caudal criativo, somando fatos imaginário, suas construções arejadas, arquitetura de palavreiros, feito assim ainda um recolhedor de pertencimentos de seu tempo, sua época, com seu olhar ora irônico, ora cheio de humor, mas num delineamento que enserena verbos, tópicos e finais. A baunilha dos parágrafos.

Traz a singeleza da vida pro livro, para o seu tão peculiar contar. Descreve cores e cenas com fruição embonitada da própria riqueza do olhar extremamente sensível. Um retratista de qualidade pescando no remanso do cotiadiano dia-a-dia de uma pacata cidade do interior, que se alimenta de seres e de suas sensações e movimentos. Licânia. Contos, ou todos eles aparelhados formando um romance?

Clauder Arcanjo encorpou um livro bonito, que se apresenta bem e encrespa a cabeça do leitor com gosto de, ao final, querer mais e o que era bom acabou-se, quem leu arregalou-se, como dizia o Palhaço Buscapé de meu circo de antigamente.

O escritor provendo sua situação de estar no mundo. Julio Emilio Braz (Histórias Maravilhosas de Povos Felizes) diz que as histórias que contamos nos dão a eternidade...

Clauder Arcanjo desenha momentos resgatados de vidas no que muito bem retrata literariamente. E se faz parte do acervo literal pelas suas próprias mãos e com a sua bela paleta arquitetural de contações em alto estilo.


-0-

Silas Correa Leite
Santa Itararé das Letras, São Paulo
E-mail:
poesilas@terra.com.br
Teórico da Educação, Jornalista Comunitário, Conselheiro em Direitos Humanos
Pós-graduado em Literatura e Arte na Comunicação (USP)
Autor de O Homem Que Virou Cerveja, Prêmio Valdeck Almeida de Jesus, Salvador, Bahia, 2009, Giz Editorial, SP
Blogue:
www.portas-lapsos.zip.net

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Os Poemas Assustadores de Marcelo Ariel








Pequena Resenha Crítica


CHORUMES: Os Poemas “Anjos Afogados” de Marcelo Ariel


“Os seres humanos me assombram”

Markus Zusak

In, A Menina Que Roubava Livros




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Espantalhos: seres reses. A máquina de existir é a máquina de parir seres. Serão seres? Existem? “Existir a que será que se destina?”, perguntou cantando Caetano Veloso. O Poeta de Cubatão, Marcelo Ariel, sabe. Deve doer saber. E nos responde por tabelas ou diretamente nas fuças com horror de ver, viver e escreviver: anjos afogados. Anjos em fios de alta tensão. A morte-amor. Choro e ranger de dentros. Jean-Paul Sartre dizia que ninguém é escritor por haver decidido dizer certas coisas, mas por haver decidido dizê-las de determinado modo.

A chocante Poesia de Marcelo Ariel é uma fronteira cercada de destroços por todos os lados. Vidas-Socós. As duras realidades focadas na névoa-nada. A vida sobrevivencial lançando chamas na UTI do cáustico olhar plausível. A alma sangra entre o chão-diesel e os estilhaços poéticos multicortados de pontos de interrogachão. A cena do crime de existir. Escrever é um modo de estar no mundo, para repugnar-se contra o próprio mundo, e ainda assim sentenciá-lo ao assento de horror.

A poesia tirando enterros da alma em pedaços. O revólver quente da criação destrinchando verbos, versos, ver-se, ter-se, verter. Prismas-caças-e-caçadores. Poesia dolor. “Como o céu que dança pra si mesmo/Sem a nossa presença/E depois apaga” (In, Com Miles Davis na Serra, pg.48). Os desterros são íntimos. Os aterros sociais têm seus chorumes dolorosamente lírico-contestatórios por assim dizer. Feito um açougue metafísico de almas letrais.

Marcelo Ariel voa com remos. As desnaturezas do ranço humano/urbano/insano. A maldição daquele que respiga as sobras, restos de nadas: sub-seres. E ainda achando poemas aí. Meio Jean Genet Pretobrazyl, um pleno pliniomarcos mestiço nas trincheiras do caos que retrata em fotogramas de amarguras, pintando com lucidez palavral os seus achados e perdidos. Não é fácil. Nunca foi.

Um Goya-rimbaud. Os sem cérebro produzem monstros. Como ainda tirar poemas do inferno?. O lusco-fusco não sabe de lágrimas de muito além de Dante. O inferno são os seres. O céu rebrilhante de Cubatão é poluição pesada. A poesia toxina esplende um historial da morte poeticamente homeopática dos que foram soterrados. Em meio ao monturo Marcelo Ariel vaza poemas-lágrimas, poemas duros, tristes, contundentes, assustadoras lascas de seu meio. Filósofo e metafísico. Que ciência há em não pensar sobre? Entre carcaças de todos os tipos e naipes, os poemas-letra-de-rock pesado em valas perdidas. Chorumes-rajadas. Metralhando palavras que se encorpam em peso-visão, brutezas pegajentas. Falou o diabo e aparece o anti-clímax. A vida só é possível reinventada, disse Cecilia Meireles.

Poemas sentidos. Há sangue pra tudo. Serão só poemas? Testemunhos-depojos. Não, são também luzes negras sobre macadames de lixões. “A morte não dorme/A alma não pensa/A vida não vive” (In, Veredito, pg 93). Marcelo Ariel é isso: esquisito porque puramente real por mais que isso nos doa. O asco é mais embaixo. Só os imbecis são felizes. Não há sensações no esquecimento. Ai de ti Cubatão-Brazyl! Ensaios de amargedons localizados, datados. Estúdios a céu aberto entre viadutos, chaminés, mangues e resíduos fichados. Entre ratos, abutres, quasehumanos. A sifilização-réstia. O olhar transido é ainda recolhedor sistêmico. Ponches de restos. Sangria desatando subvidas. Os excluídos sociais, os carentes, os sacrificados, as amarguras de. Tudo do mesmo. Paradoxos inexatos que sucumbem entre mesmices impunes. O teatro de absurdos da vida real no seu pior estertor. “Na noite/Se convertendo em transparência sem tempo” (In, Espelho, pg.137). Marcelo Ariel não é fácil também. Somos literalmente atravessados por seus versos de arames em tintas entrecortadas dele mesmo no seu estilo todo próprio de repaginar o que vê/sente/comporta/assoma/redime... liquidifica. Assustador.

Marcelo Ariel é um soco de luz no LER. Ler o livro de Poemas “Tratado de Anjos Afogados” é um sopro na acomodação saturada. Poesia puro sangue. Os perdidos nas estrofes sujas da mais descarnada vida são literalmente revivificados. Escrevendo ele tira fantasmas da névoa e diz da dor de havê-los. Dói sentir a dor dos outros. Não há como sarar o mundo; já não é possível curar o mundo. Parafraseando Baudelaire, sob o crânio da raça humana o horror não faz milagres. Os miseráveis precisam de poetas para retratá-los, serem assim disformes registrados em suas condições de subvida, como seres ocasionalmente sobrevivenciais que acabam sendo, entre os chorumes dos condomínios fechados e os tantos insensíveis podres poderes. As cinzas das desonras.

Falando sério, cara pálida, é muito difícil resenhar um livro como o Tratado dos Anjos Afogados de Marcelo Ariel. Você procura palavras exatas e não acha, não cabem, querem refugar o sentir, o pensar, o se achar num igual. Não há metáforas que caibam como identificações em poemas de tal grandeza cívica até. Nem são almas penduradas nos varais para secarem os ossos, mesmo que pareçam. Com tanta “informação” (poesia tensão) você fica irado com a carga poética que recebe, apreende, engole a seco; feito um ocasional renunciante à vida. Vida? Como não fazer parte daquilo e se aceitar humano? Que vida? O que é isso? Seres? Que seres? Chorumes.

Poemas como incompreendidas nênias entoando impressões digitais de mortos. A carne-vida nos poemas insepultos. Dentro das covas clandestinas desses céus e infernos não há GPS. Que cadáver-vitrine é a raça humana, a civilização por si mesma? Marcelo Ariel arranca poemas de feridas. Leia-o. Isso é que é Poesia. Venha para o mundo de Marcelo Ariel. Mas se apronte que vai doer um bocado. No entanto, você também precisa se enxergar no charco, ver a própria lama social entre cacos de espelhos.

Subterrâneos de confins. Marcelo Ariel escreve poemas como quem recupera, com sua placa mãe de captura em alta sensibilidade, os suspiros dos sentenciados a sobreviver; como ainda um pior castigo-condenação do que ter que existir.

Existir?

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Silas Correa Leite – E-mail:
poesilas@terra.com.br
Blogue: www.campodetrigocomcorvos.zip.net
Autor de O HOMEM QUE VIROU CERVEJA, Giz Editorial, 2009, SP, Prêmio Valdeck Almeida de Jesus



BOX:

Livro: TRATADO DOS ANJOS AFOGADOS – Gênero Poesia
Autor: Marcelo Ariel – Literatura Brasileira Contemporânea
marceloahriel@yahoo.com.br – Coleção Sentimento do Mundo
Edição 2008, 216 páginas


Editora: LetraSelvagem – Associação Cultural LetraSelvagem
Organização Nicodemos Sena
E-mail:
letraselvagem@uol.com.br
Site: www.letraselvagem.com.br